Marisa Monte atua, esta terça-feira, na Super Bock Arena, no Porto, e no dia 5 em Oeiras. A estrela dos concertos será o álbum "Portas".
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É com "Portas", disco gravado durante a pandemia e que junta um elenco de colaboradores notáveis, que Marisa Monte assinala o regresso a palcos nacionais. Um disco que resume a sua atração por géneros como a bossa nova, o jazz, a soul e o rock - e sua capacidade de os fundir em canções inteiras. Em conversa com o JN, a cantora fala das particulares condições de gravação, do momento complicado que o Mundo atravessa e sobre o futuro das artes no Brasil, além de deixar pistas sobre os concertos em Portugal.
Conte-nos um pouco do processo deste disco, gravado em pandemia e a partir de tantas cidades.
Foi um grande desafio encontrarmo-nos pessoalmente para gravar. Optámos por um método de produção híbrido, alternando gravações presenciais no Rio com gravações remotas em Lisboa, Madrid, Barcelona, Nova Iorque e Los Angeles. Para minha surpresa, a tecnologia possibilitou experimentar formas de relacionamento que não teríamos tentado se não fosse pela necessidade extrema. A conectividade digital do Mundo contemporâneo foi destaque na pandemia. "Portas" acabou sendo o álbum que fiz com mais colaborações internacionais, em mais cidades, sem sair do Rio e sem perder o calor nem o espírito coletivo.
O disco reúne uma paleta de colaboradores de luxo. Como surgiram essas escolhas?
É o disco onde o meu trabalho é mais coletivo. Tenho a oportunidade de convidar pessoas com quem gostaria de trabalhar. "Portas" reafirma a presença de parceiros já consolidados como Arto [Lindsay], Arnaldo [Antunes], Nando [Reis], Seu Jorge, Pretinho [da Serrinha]. E a renovação, com novos encontros: [Jorge] Drexler, [Marcelo] Camelo, Chico Brown e Flor. Tudo consequência natural da afinidade e admiração que tenho por todos eles.
Depois da pandemia, uma guerra. Que lugar tem a música no meio desta loucura?
Compartilho todos os sentimentos de incerteza, angústia e medo deste momento trágico, mas através da arte quero oferecer uma resistência poética, criativa e amorosa. A música tem a capacidade de conectar pessoas num plano existencial mais interessante, promovendo um contraponto à dura realidade do quotidiano. É a minha forma de contribuir, no campo do imaginário, onde tudo pode ser pensado, inclusive um Mundo bem melhor. Precisamos de poder imaginar um Mundo melhor para poder transformar o ideal em real.
E o Brasil, que sinais encontra para os próximos anos, nomeadamente nas artes?
Gostaria que o Governo do Brasil tivesse mais consciência do potencial económico da cultura e da indústria criativa. Vejo uma falta de noção dessa grandeza e um grande desperdício. Porém, isso faz com que eu me sinta mais motivada a continuar.
Que podemos esperar dos seus concertos em Portugal?
O show é um meio audiovisual que vai além do álbum e das músicas, onde as imagens potenciam os sentidos das canções. O cenário foi desenvolvido a partir da série "Fundos", obra da artista plástica Lúcia Koch. Ela faz um trabalho a partir de caixas criando ambientes arquitetónicos com luzes e sombras que achei que seria perfeito para a atmosfera do show. A ideia era criar um diálogo entre o mundo interior - o isolamento, o confinamento - e o mundo exterior, através da imaginação, do sonho, do poético e do lúdico. A partir desse princípio, uma equipa de criação e de editores, programadores e iluminadores, tendo Batman Zavareze e Cláudio Torres como codiretores, desenvolveu os vídeos e efeitos visuais. Além disso, temos uma banda incrível e um repertório que contempla músicas de todas as fases da minha carreira.