Misericórdia do Porto acusada de censurar obra sobre o passado esclavagista do Conde Ferreira
A Bienal de Fotografia do Porto, patente até dia 2 de julho em vários espaços da cidade do Porto viu uma das obras de arte censuradas na sua inauguração.
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O antigo panóptico do hospital Conde de Ferreira (CHCF), tem patente a exposição" Vento (A)mar", dos artistas Dori Nigro e Paulo Pinto, artistas brasileiros radicados no Porto, como parte da Bienal de Fotografia do Porto. Segundo noticiou o jornal "Público" a exposição estava aberta há meia hora, quando uma das suas salas foi mandada encerrar pelo administrador executivo do centro hospitalar, tutelado pela Santa Casa da Misericórdia do Porto (SCMP), Ângelo Duarte. Em causa estavam uma obra que questionava sobre o passado esclavagista do Conde Ferreira.
Segundo explicou ao JN, Virgílio Ferreira, diretor da Bienal de Fotografia do Porto, o administrador hospitalar chamou-o à parte "e disse que os trabalhos não poderiam estar ali". Depois de uma conversa, Virgílio Ferreira, afirma que lhe terá comunicado que "qualquer decisão sobre as obras teria de ser tomada pelos artistas". A justificação dada é que se estaria a "falar do patrono do hospital". Na obra "Adoçar a Alma para o Inferno III" é feita uma correlação entre quantos escravos valeria um hospital psiquiátrico e 120 escolas, alusivo aos milhares de pessoas escravizadas que o Conde Ferreira levou de Angola para o Brasil e que foram vendidas para os proprietários dos engenhos de açúcar. Estas frases estariam inscritas em espelhos que faziam parte da obra.
Nesse mesmo momento e já com a exposição aberta, a obra foi selada, criando, como conta Virgílio Ferreira "um desconforto brutal". Afastada a possibilidade de encerrar a exposição, a Misericórdia terá decidido, esta semana, reabrir a sala, retirando todos os espelhos, amputando a obra e mantendo apenas um açucareiro com a cara do Conde Ferreira, como se fosse a obra completa.
Como explica Virgílio Ferreira, "a Santa Casa da Misericórdia tem com a Bienal de Fotografia do Porto, um protocolo de acolhimento, mas foi dada total abertura aos artistas". O mesmo responsável, diz ao JN, que mais do que "um estudo de caso, deve servir para uma conversa mais ampla".