Morrissey arrasa indústria da música: "Foram vocês que fizeram a Sinéad desistir"
Na sequência da notícia da morte da cantora Sinéad O'Connor, aos 56 anos, o músico Morrissey, ex-integrante dos britânicos The Smiths, publicou um texto no seu site oficial, onde faz uma crítica contundente à imprensa e à indústria da música pela falta de apoio à artista e às recentes homenagens.
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"Foi abandonada pela editora depois de vender sete milhões de discos. Ficou louca, sim, mas desinteressante, nunca. Não fez nada de errado. Tinha uma vulnerabilidade orgulhosa... e há um certo ódio da indústria por artistas que não se encaixam (algo que conheço muito bem), e que só são elogiados após a morte, quando já não podem responder”, escreveu o músico, numa mensagem intitulada "You know I couldn't last" ("Sabes que eu não poderia durar", em tradução livre, também o título de um tema do cantor).
Morrissey assevera que os diretores executivos que anteriormente rejeitaram contratar Sinéad "estão hoje a apelidá-la de ‘ícone feminista’". "Celebridades e duendes e editoras com uma diversidade artificial estão a empoleirar-se no Twitter para escrever banalidades. Foram vocês que fizeram a Sinéad desistir”, atirou, elogiando a coragem de falar que a irlandesa tinha "quando toda a gente se calava".
"Amanhã, os betinhos que a idolatram voltarão a escrever lixo online, voltarão à sua cultura de cancelamento, à sua superioridade moral, aos seus obituários vomitados. A Sinéad não precisava das vossas tagarelices estéreis”, concluiu Morrissey.
Sucesso, abusos e traumas
Sinéad O’Connor, icónica voz de "Nothing compares 2 U", morreu na terça-feira, um ano depois de um dos filhos, de 17 anos, ter cometido suicídio após ter fugido do hospital onde estava internado sob vigilância. "Sobrevivente de uma infância de abuso", como não gostava de ser conhecida, a artista falava abertamente sobre os abusos físicos e sexuais inflingidos pela mãe, que tinha, em casa, uma"câmara de tortura" para castigar os filhos.
Diagnosticada na idade adulta com síndrome de stress pós-traumático e de distúrbio borderline, Sinéad foi internada em clínicas psiquiátricas várias vezes. Em 2017, deixou os fãs preocupados com um relato de solidão e angústia publicado no Facebook. "Estou a lutar, a lutar, a lutar como milhões de pessoas que conheço, para continuar viva todos os dias", frisou, num vídeo emotivo.
Depois de estourar internacionalmente com o álbum "I do not want what I haven’t got", a irlandesa foi notícia em 1992 por rasgar uma foto do papa João Paulo II no programa "Saturday Night Live", um dos mais populares nos EUA, a que se seguiu um forte movimento de ataque por parte da comunidade católica e da indústria musical.
A imagem do Papa tinha uma ligação íntima com a infância sofrida da artista: no dia em que a mãe de O'Connor morreu, a então jovem de 18 anos tirou da parede do quarto da matriarca a única fotografia, a imagem do Papa, que a mulher, convictamente religiosa, admirava. O'Connor guardou-a, esperando o momento certo para destruí-la, em protesto contra os abusos na Igreja Católica.