Nininho Vaz Maia lança álbum de estreia: "Raízes". E não quer dar concertos para menos de mil pessoas.
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Em 1992, no dia 2 de julho, a pequena povoação de San Fernando, na baía de Cádis, no Sul de Espanha, recebia milhares de pessoas para a despedida daquele que foi o maior cantor de flamenco dos tempos modernos: Camarón. A segurar o féretro estavam Paco de Lucía e Tomatito. As casualidades da vida quiseram que 29 anos depois, no dia da morte do seu referente, Nininho Vaz Maia lançasse o seu álbum de estreia, "Raízes".
"Quando a Triana [mulher] me disse, fiquei arrepiado, não sabia que tinha sido naquele dia", afirma o cantor ao JN. Foi uma série sobre a vida de José Monje Cruz que, durante o confinamento, o levou a registar este disco. "Quando acabei de ver a série, decidi que ia gravar. Ele também tentou e falhou. E tornou a tentar e triunfou. E também tinha um estilo próprio".
Aquilo que diz ser um estilo próprio é uma mescla adocicada de pop, música latina e flamenco, que já lhe valeu 40 milhões de visualizações no YouTube. O mesmo canal transportou-o para a fama, quando uma prima decidiu partilhar um vídeo seu a tocar e a cantar, enquanto se encontrava em prisão domiciliária. Seguiu-se a liberdade, centenas de concertos, a participação numa novela e consequentes programas televisivos.
Também no YouTube foram lançados, um a um, os videoclips dos 11 temas de "Raízes", na sua maioria produzidos pela mulher, a espanhola Triana Marín. E foi por influência dela que começou a cantar em castelhano, com a certeza de que iria abrir mercados. Foi também assim que chegou ao novo tema, "Bailando". Mas, como repete ao longo da entrevista, como um mantra, "passo a passo". Até alcançar o seu objetivo: dar um concerto com Niña Pastori, também de San Fernando.
Um álbum "cigano"
Na promoção, leva sempre colado o epíteto cigano. "No início, irritava-me estarem sempre a perguntar pela minha família. Há a ideia de que vivemos em tendas e andamos a cavalo. Um cigano é como qualquer outra pessoa. Quando, por exemplo, o Agir vai à televisão, não tem de explicar porque tem tatuagens, fala apenas da sua música", diz.
E a sua música é cigana? "Sim, é." E isso é notório em temas como "Não sou perfeito" ou "Nova era".
Mas o que mais uniu os fãs foi o tema "Gosto de ti", gravado com o filho Cristiano, e apresentado num concurso televisivo. "A televisão é sempre importante, chega a muita gente".
Para Nininho Vaz Maia, o problema agora é fintar as restrições pandémicas. "Quero fazer uma coisa em grande, porque sei que as pessoas têm sede de mim". É por isso que não pretende fazer concertos para menos de mil pessoas. Para 2022, já tem a agenda cheia. Agora é esperar.
Muitos fenómenos ciganos no YouTube
Em Portugal a música cigana sempre foi tendo aceitação a conta-gotas, com nomes bem conhecidos, como os Ciganos d'Ouro, com dois álbuns gravados: "Maktoub" e "Libertad". O grupo formado em 1993 destacou-se pelos virtuosos guitarristas que fizeram das rumbas flamencas grandes êxitos ampliados por programas de televisão.
Também num circuito profissional, Diego el Gavi grava em 2019 o disco "Puerta del alma", respeitando a tradição e os códigos flamencos. Uma viagem que, como o próprio contou, começa com uma cassete dos Gipsy Kings, esse fenómeno do Sul de França que revolucionou o mercado da música nos anos 1990 do século passado.
Mas se estes nomes são consagrados e fazem parte de um circuito profissional, há muitas vozes, como Xano, Israel ou Ofélia, que são um êxito no YouTube, com as suas músicas ciganas em português, com rumbas onde não falta o órgão.
Também fenómenos como o espetáculo "Romani", na Casa da Música, no Porto, ou a série documental "A música cigana a gostar dela própria", de Tiago Pereira, permitiram descobrir um conjunto de talentos e vozes de uma grande diversidade de estilos que circulavam apenas dentro da comunidade cigana.