Estreia esta quinta-feira nos cinemas "Sirat", o novo drama de Oliver Laxe. É o filme-choque de Cannes que ninguém deve perder
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Se é daqueles que perdeu a esperança no presente e futuro do cinema, ou de qualquer outra forma artística, e que pensa que só o que é clássico é que é bom, desengane-se. Vá ver "Sirat" e depois "falamos". Ou fale com quem costuma dialogar sobre os filmes que vai ver ao cinema.
O jovem espanhol Oliver Saxe já tinha dado um ar da sua graça com o belíssimo "O que arde", primeira das suas obras a chegar até nós. Agora, com "Sirat", a que o júri de Cannes negou a que seria justíssima Palma de Ouro para lhe entregar o Prémio (de consolação) do Júri, estabelece-se definitivamente como um dos grandes autores do cinema contemporâneo.
Dizer que o filme é sobre um pai - magnífico e corajoso Sergi López - que vai até Marrocos, com o filho mais novo, em busca da filha mais velha que desapareceu numa rave no deserto, não chega, porque esta história, ou ponto de partida de uma história, poderia levar-nos para infinitos caminhos.
O de Oliver Laxe é único, um reflexo do cinema sensorial que busca e da sua forma de olhar para o mundo. Tudo começa pelo som, que ocupa um espaço a que não estamos habituados. Visualmente, o filme tem uma relação endémica, carnal, com o espaço geográfico em que se desenrola, o deserto do norte africano.
As personagens que levam consigo o protagonista na viagem de "Sirat" transportam as cicatrizes de uma vida. E há aquela sequência, ai aquela sequência que nunca irá abandonar a memória de quem tiver a coragem de entrar na sala escura, e olhar para si próprio...
"Sirat" é um murro no estômago, um desafio às nossas convenções de espetador. Um grito de um criador desesperado com o (fim do) mundo que o (nos) rodeia? As referências bíblicas e corânicas estão lá, o paganismo tribalista também, a arte (a música, o cinema) como escape é um recado evidente. Se a cultura nos pode salvar, "Sirat" é uma tábua a que nos devemos agarrar.