E se houvesse uma app que lhe dissesse quem é o seu verdadeiro amor? E um estudo científico que lhe demonstrasse que o seu amor está a morrer? E um filme que lhe mostrasse como sobreviver?
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É a série que toda a gente anda a ver, estreou sexta-feira e já está em 2.º lugar no top da Netflix em Portugal: "The One". A pergunta que faz é esta: e se houvesse uma app que lhe dissesse, instantaneamente e com precisão científica, quem é o seu verdadeiro amor? Perante isso, as possibilidades são infinitas: revolucionaria o namoro? Inibiria a espontaneidade e a emoção humanas? Levaria a desconfianças insanáveis perante a tecnologia? Ou abriria um admirável novo mundo ao romance? A resposta é, aqui como no Tinder, que cada um está por sua conta. Pormenor talvez relevante para a popularidade da série: Albano Jerónimo, o galã nacional, anda por lá e é finalmente um ator Netflix.
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Quem também está preocupado com o amor, não necessariamente conjugal, é o nipo-britânico Kazuo Ishiguro, que venceu o prémio Nobel da Literatura em 2017 e que em 2021 publica o seu primeiro romance pós distinção. "Klara e o Sol" chegou discretamente no início deste mês, com uma pergunta que provavelmente irá acompanhar-nos durante muitos anos: Como é que os robots olham para nós? Klara, a amiga androide que vai cuidar de uma humana doente aprende e partilha a resposta com enorme precisão. Parece um romance distópico, mas é sobretudo uma perspetiva humanista que nos confronta com quem queremos ser e até que ponto deixamos que o medo da solidão, da morte e do desamor nos subtraia. Se até Klara, um robot, consegue perceber a importância do sol, recarregando nele as suas baterias, como podem os humanos prescindir daquilo que os faz únicos, vendendo a alma ao deslumbramento tecnológico, supondo que isso diminui o risco de sofrimento?
Sofrimento nenhum é passível de ser diminuído, mas a linguagem utilizada pode fazer adivinhar um terramoto sentimental, garantem três investigadores de Psicologia da Universidade do Texas, em Austin, nos EUA. Voltamos ao amor conjugal. Um estudo sobre o fim do amor noticiado pelo diário espanhol "El País", no último fim de semana, revela que o vocabulário utilizado por um casal três meses antes da separação vai subtilmente denunciá-lo, mesmo que o próprio casal não tenha disso consciência. Durante um ano, os investigadores monitorizaram um milhão de publicacões na internet de quase sete mil utilizadores, analisaram as palavras e a pontuação escolhidas antes daquela clássica fronteira cristalizada no fatal "temos que falar" e chegaram a uma conclusão: a chave está na linguagem. Três pistas: na antecâmara da ruptura, um ou os dois membros da relação começam a usar verbos no condicional, começam a conjugá-los na primeira pessoa e eliminam os advérbios de lugar. "Não é a mesma coisa usar uma palavra ou um sínónimo", asseguram os investigadores. É esse o teste do algodão.
Lembra um livro de Julian Barnes, publicado há dez anos, "O sentido do fim". Nele, o autor partilha uma teoria sobre a lógica da acumulação. "Até que ponto as relações humanas podem ser expressas numa fórmula lógica ou matemática?", pergunta. " Se sim, que sinais podem colocar-se entre os números inteiros? Mais e menos, evidentemente; às vezes multiplicação e claro, divisão." Contas feitas, surge a resposta sobre a acumulação de perdas. "Apostamos numa relação, ela falha; avançamos para a próxima relação, falha também; e talvez o que perdemos não sejam duas pequenas somas negativas, mas o múltiplo daquilo que apostámos. É isso que sentimos, de qualquer modo. A vida não é só adição e subtração. Também há acumulação, multiplicação da perda, do fracasso."
É possível sobreviver a isto? O cineasta alemão Ulrich Kohler diz que sim. No filme, "No meu quarto", que a RTP2 exibe esta segunda-feira vinte minutos depois da meia-noite, Armin é um homem que, ao acordar de uma ressaca, percebe que é o único espécime humano vivo. Para sobreviver, terá de mudar. Ou encontrar mais aguém que estranhamente também tenha sobrevivido. E isso pode sempre acontecer.
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