A trágica queda de avião num glaciar dos Andes voltou ao ecrã em "A sociedade da neve" e já é um êxito de streaming.
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“Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos” é mais do que uma passagem bíblica. É um hino de abnegação, um grito silencioso de coragem, escrito à mão num papel, por alguém em fim de vida que decide ajudar os companheiros abrindo mão do próprio corpo. Há aqui um arrepio poético, sim, falamos de canibalismo porque é impossível ignorá-lo no filme “A Sociedade da Neve”, que estreou na Netflix no início de janeiro e rapidamente ascendeu aos mais vistos da plataforma de streaming.
Dirigida pelo espanhol Juan Antonio Bayona, a história baseia-se na verídica e heroica luta pela sobrevivência da equipa uruguaia de râguebi “Old Christians Club”, cujo avião se despenhou na Cordilheira dos Andes, em 1972. Os atletas partiram de Montevidéu com destino ao Chile, mas um erro de cálculo do piloto fê-los embater na montanha. Das 45 pessoas que seguiam na aeronave da Força Aérea Uruguaia, 29 morreram e só ao fim de 72 dias houve uma operação de resgate dos sobreviventes. Setenta e dois dias transformados numa eternidade, com temperaturas noturnas abaixo dos 30 graus.
Ao frio juntou-se o fantasma da fome e são tantos os momentos de aflição dos jogadores que é impossível não passar as mais de duas horas de filme com o corpo contraído de aflição. “O que acontece quando o mundo nos abandona?”, questionam, e nada mais importa – qual Deus? – a não ser protegerem-se, cuidarem-se, amarem-se. “A minha fé não está no teu Deus. Porque esse Deus diz-me o que tenho de fazer em minha casa, mas não o que fazer na montanha. Acredito noutro Deus. No Deus que o Roberto tem na cabeça quando me cura as feridas. No Deus que o Nando tem nas pernas para continuar a caminhar obstinadamente. Acredito na mão do Daniel quando corta a carne. E no Fito quando a reparte”, atira um dos atletas, num dos diálogos mais marcantes do filme.
Apesar de desmoralizados, malnutridos e exaustos, um rasgo de fé levou três deles a abandonarem o grupo para tentarem caminhar até ao Chile. Dez dias de sofrimento em prol de algo maior.
“A Sociedade da Neve”
Juan Antonio Bayona
Netflix