Álbum de Paul e Gaëtan Brizzi "O inferno de Dante" transforma o inferno num local apetecível e sedutor.
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Não é a primeira vez que a banda desenhada adapta "O inferno de Dante", incluindo uma versão Disney de texto integral, mas possivelmente o horror e a grandiosidade daquele local de castigo eterno, capaz de provocar temores no mais corajoso e íntegro, nunca foram retratados de uma forma tão espetacular como nesta versão dos irmãos Paul e Gaëtan Brizzi, que A Seita e a Arte de Autor disponibilizaram em português desde a passagem de Paul pelo festival Maia BD.
Se a adaptação de um poema da dimensão da obra-prima de Dante Alighieri era já em si um risco enorme, ele redobrou quando os autores decidiram realmente "adaptar" o original, suprimindo cenas que julgaram redundantes ou maçadoras, para dotarem esta sua versão de uma dinâmica que proporcionasse uma leitura ritmada.
Como os autores assumem igualmente no prólogo, de uma sinceridade pouco vulgar, esta é uma obra mista de banda desenhada e ilustração, com a narrativa sequencial interrompida recorrentemente por vinhetas de página inteira, de redobrado impacto devido às dimensões generosas do livro.
Mas são estas vinhetas que tornam mais fantástica e deleitosa, mesmo quando aterrorizadora, a visão do inferno que os irmãos Brizzi nos proporcionam.
Um inferno povoado de gente sem esperança nem fé, a penar pela eternidade, que se revela um local tão grandioso quanto opressivo, de uma forma que faz o leitor sentir-se ínfimo.
Isto implica, obviamente, mesmo para quem conhece o original, uma aproximação sem preconceitos, para fruir inteira e intensamente este tomo ilustrado de forma superlativa, que nos mostra a demanda de Dante pela sua amada Beatriz, acompanhado pelo poeta Virgílio, com quem percorre, um após outro, os nove círculos do inferno, cruzando-se com o barqueiro Caronte, filósofos como Aristóteles ou Platão, Diógenes na sua procura infinita, o imponente Minos obcecado pela luxúria e os prazeres carnais ou o Minotauro.
E terminada esta visita inesquecível ao Hades dos irmãos Brizzi, resta regressar às páginas do livro, para nos perdermos nas belas ilustrações que tornam este Inferno um prazer.