"Maria", quinto álbum de originais, é o trabalho mais pessoal da fadista. E traz um novo olhar sobre a tradição.
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Ao quinto álbum, Carminho mergulhou mais profundamente nas memórias afetivas da infância para tentar perceber "onde mora a essência do fado" que sempre ouviu e que tanto gosta de cantar. Num registo assumidamente mais pessoal, aquela que é uma das mais internacionais artistas portuguesas quis plasmar em "Maria", o novo disco que chega esta sexta-feira ao mercado, essa experiência emotiva. "Sinto que os três momentos primordiais deste disco são a voz, o ambiente e a história", revela.
Depois de ter cantado Tom Jobim, um dos criadores da bossa-nova, "Maria" é o seu álbum "mais pessoal de sempre", diz. "É um disco homónimo de alguém que abre um bocadinho mais a sua intimidade. Por isso é que lhe dei este nome. É o nome que me deram ao nascer mas, ao mesmo tempo, é o nome de toda a gente".
Outra das marcas pessoais deixada neste trabalho diz respeito à produção. "Fiz questão de participar ativamente na sua produção porque a viagem que fiz aos primórdios da minha infância e às memórias que tinha de ouvir cantar fado ao colo do meu pai, assim o determinou. Não era necessário que fosse eu a produzir, mas esta experiência, que para mim foi uma estreia, surgiu de forma muito natural."
Fado precisa de regras
Dos 12 temas do novo trabalho, metade têm assinatura da própria Carminho. Exemplos disso são "A tecedeira", cantado à capela, que abre o disco; "Estrela", em que a fadista se faz acompanhar de guitarra elétrica; "A mulher vento"; "Poeta"; "Se vieres", que canta na melodia tradicional do Fado Santa Luzia, de Armando Machado; e "Desengano", que gravou no Fado Latino, de Jaime Santos.
Compôs também a música para o poema "Quero um cavalo de várias cores", de Reinaldo Ferreira. "É uma história que está muito ligada a uma memória muito pessoal. Tive um amigo que morreu ao cair de um cavalo", confessa.
Outros autores são Joana Espadinha, que assina a letra e música de "O menino e a cidade" e "As Rosas", e Pedro Homem de Mello, de quem canta "O começo", no Fado Bizarro, de Acácio Gomes.
A intérprete resgatou ainda um tema do repertório de António Calvário, "Pop fado", de César Oliveira e Fernando Carvalho, e "Sete saias", com letra e música de Artur Ribeiro.
"O fado é uma língua viva e, como tal, tem evoluído e não deixará nunca de evoluir. O tema "Pop fado", por exemplo, foi escrito e composto em 1966 e já remetia para o eterno dilema entre tradição e modernidade. Quando o ouvi pela primeira vez, porque faço sempre muita pesquisa para os meus discos, chorei a rir com a letra. No fundo, é uma crítica a mim própria", concede.
Mas, torna, "são precisos dois pêndulos para manter a linguagem do fado sempre atual. Para ser tradicional e de raiz, o fado precisa de regras mas, para continuar a ser uma língua viva, precisa de ser do seu tempo. Esta é uma daquelas questões que nunca será consensual e que quis trazer para o meu disco. Sim, porque "Maria", é também uma visão do fado tradicional com a atualidade e a contemporaneidade".