Nota de repúdio contra aluna de 14 anos agravou mal-estar. Direção diz desconhecer queixas de encarregados de educação.
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"Há professores que batem, puxam os cabelos, dizem palavrões, dão murros nas mesas. Insultam, humilham, agridem verbalmente. Tudo é ignorado". O relato é de um pai de um aluno do Conservatório de Música do Porto, um dos muitos que o JN recolheu nos últimos dois dias, após a publicação de uma nota de repúdio contra uma aluna de 14 anos, aprovada pelo Conselho Geral, afixada no corredor do Conservatório e publicada no site da escola.
"Ninguém da turma da Rafaela fala com ela porque denunciou certas coisas", contou ao JN Aquiles Oliveira, pai de Rafaela Oliveira, aluna a frequentar o 9.º ano. "No ano passado, descobrimos que certos professores faltavam, mas as aulas eram registadas. E denunciámos à Direção", recordam Aquiles e Carla Ribeiro, sublinhando que nunca tiveram resposta por parte do Conservatório de Música do Porto (CMP). A queixa seguiu depois para o Ministério da Educação.
Os comentários de Rafaela nas redes sociais e a denúncia num vídeo com os pais originaram um processo-crime, já arquivado, e um processo disciplinar à aluna.
"O ambiente é mau. Em relação a esta situação concreta foi pedido, no conselho de turma, que os professores dessem uma posição de solidariedade para que o processo-crime avançasse", recorda Manuela Costa, professora de piano no CMP há 28 anos. "Fui a única que se opôs. A decisão é tudo menos pedagógica", lamenta.
A Associação de Pais, recentemente eleita, não comenta a situação e garante já se ter manifestado sobre a nota de repúdio, "não querendo contribuir para a exposição pública de um aluno menor". Questionada, a Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares não prestou esclarecimentos, nem confirmou a entrada de queixas que os pais garantem ter feito.
Experiência traumática
"Todos os dias penso em tirar o meu filho de lá", conta uma mãe que pediu o anonimato por receio de represálias sobre o filho, no 3.º Ciclo. "Aquela escola faz-me sofrer todos os dias, pela forma como tratam os alunos e como sou tratada", explica.
"No ano passado, uma professora empurrava e sacudia os alunos. Dizia que era para corrigir a postura", relata uma outra mãe, que ameaçou processar a escola. "A partir daí, os problemas com o meu filho acabaram", explica, dizendo que no CMP se vive "um clima de guerrilha". "Em termos de relacionamento com os pais, é o pior sítio onde já estive. A escola não está preparada para a diferença, nem para lidar com os maus alunos", lamenta.
Andreia (nome fictício) sabe-o por experiência. "No 3.º ano, o meu filho ainda não sabia ler. Foi quando descobri que tinha dislexia. Até aí, para o CMP, era um aluno indisciplinado e preguiçoso", contou. "A pedopsiquiatra disse que o meu filho estava à beira de uma depressão e que não podia lá voltar. Estava a ser uma experiência traumática", recorda. "Houve uma coisa que me chocou muito. Ouvi um professor a gritar com a turma do 1.º Ciclo, ao ponto de as crianças terem começado a sair da sala. Uma delas saiu a chorar convulsivamente". O filho de Andreia hoje estuda numa outra escola, onde tira boas notas, realça.
António Moreira Jorge, diretor do CMP, garante "desconhecer em absoluto" as queixas de violência. "Se alguém sabe, deve dizê-lo. Quando reportadas, as situações não ficam sem resolução, sejam elas quais forem", diz.
Sobre a publicação da nota do Conselho Geral, o diretor refere: "Houve uma tomada de posição pela ordem mais representativa da escola. Eu acato e tomo conhecimento, mas não participei na sua aprovação".