Um incêndio tirou-lhes os filhos e a paz. Mas a luta continua, uma década depois. "Todo dia a mesma noite", série brasileira sobre a tragédia na discoteca Kiss, já está na Netflix.
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Era só uma festa universitária normal, num sítio seguro, pensavam os pais. Mas há dez anos que aquela noite - 27 de janeiro de 2013 - os persegue. A saudade não conhece estados de consciência, dói sempre, "quando se está acordado ou a dormir".
A minissérie "Todo dia a mesma noite", lançada na Netflix a 25 de janeiro, recorda o incêndio que matou 242 pessoas, ferindo mais de 600, na discoteca Kiss, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, Brasil. Em cinco episódios, centrados na luta dos pais por justiça, a produção, inspirada no livro da jornalista Daniela Arbex, é um grito de revolta.
Num local com lotação para 691 pessoas estavam mais de mil. Mas as irregularidades não ficam por aqui. Inconformados com uma tragédia que "não foi um acidente", os pais dos jovens juntaram-se para investigar e denunciar o caso. O vocalista da banda Gurizada Fandangueira ergueu um artefacto pirotécnico, durante o concerto, e incendiou o material que revestia o teto da discoteca. Exposto ao fogo, esse material, não aconselhado para uso nestes estabelecimentos, libertou um gás tóxico fatal (o mesmo que era usado nas câmaras de gás durante a II Guerra Mundial).
Com os extintores inoperacionais e as luzes apagadas, o caos tomou conta da discoteca. Quando a enfermeira Liliane Duarte, Capitã do Hospital da Brigada Militar de Santa Maria, chegou lá, uma pilha de cadáveres na casa de banho, única zona iluminada. Um murro no estômago que a fez suplicar por ajuda: "Preciso de devolver estes meninos e meninas aos pais". Destaque para a cena arrepiante em que o conhecido ator Paulo Gorgulho (na pele de Ricardo Martins) percorre o parque de estacionamento da Kiss sem saber ao certo se o filho estava na festa. "Não está aqui, não está", grita, momentos antes de cair de joelhos perante o carro de Marco.
A investigação policial responsabilizou 28 pessoas pelo incêndio, mas só quatro foram condenadas. O julgamento foi, entretanto, anulado. Uma década depois, as famílias não se conformam. Porque "242 não é só um número".
Todo dia a mesma noite
Gustavo Lipsztein
Netflix