Artista regressa aos palcos para apresentar álbum de estreia. Trabalho é uma emotiva ode à cultura portuguesa.
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Outrora Pedro Simões, hoje assume a "Mafama", camisa desabotoada e unhas de gel, imune ao preconceito. Lisboeta de gema, o músico cresceu na Graça e a inspiração às suas ruas deve. Durante o dia dava seguimento ao legado da família nas artes plásticas. Sozinho, no quarto, escrevia as próprias letras pela noite dentro. Finalmente, aos 28 anos, orgulha-se de apresentar o primeiro disco, "Por este rio abaixo", envergando influências da cultura cigana, do fado e do folclore português, inerentes à multiculturalidade dos bairros típicos lisboetas.
Desviar o olhar da música deixou de ser opção. "Percebi que fazia isto ou iria acabar infeliz e frustrado por não ter feito o que queria mesmo fazer", afirma, a propósito do início do seu percurso musical, num período "pós-Buraka Som Sistema". A música tradicional portuguesa e a eletrónica uniam as mãos e Pedro Mafama tinha algo a acrescentar. "A arte é um jogo de perguntas e respostas e nós devemos adicionar algo ao que já foi feito", diz. "Eu ofereço aquilo que acho que faz falta".
Compromisso com a verdade
Basta uma espreitadela na capa de "Por este rio abaixo" para se perceber as referências do etnomusicólogo Michel Giacometti. "Uso amostras de Giacometti no disco todo, como se conversasse com ele", admite sobre aquela que é uma das suas maiores inspirações. "Uma dose bem carregada de fado e uma certa modernidade" também não foram esquecidas, bem como o cunho das melodias arabescas e africanas intrínsecas à utilização do auto-tune. O refrão de "Leva" é apenas um exemplo.
As letras são "experiências íntimas, por vezes demasiado pessoais". "Quando decidi ser músico, prometi dizer aquilo que quero e contar a minha história", revela. "O meu nome, Mafama, é um compromisso".
O disco de estreia viu a luz do dia a 28 de maio, mas o resultado final está longe daquilo que mostrava ser inicialmente, mesmo antes de a pandemia ter parado o país. "Por um lado, foi um grande anticlímax; por outro, fez-me voltar a trabalhar o disco todo". Dá "graças a Deus" por tal ter acontecido, diz e esboça um sorriso largo e orgulhoso. Contou com a ajuda do produtor Pedro da Linha e as colaborações de Ana Moura, Branko, ProfJam e Tristany.
Se durante a produção do álbum Pedro Mafama sentiu que estava a ir "por este rio abaixo", agora encara-o como uma viagem desafiante, remos na mão e vela ao alto. "Estou preparadíssimo para esticar os limites do corpo", diz, afirmação que remete para o seu último tema, "Mar Morto".
Concerto de apresentação
Há um ano, nos Anjos70, em Lisboa, o produtor de "Jazigo" não sonhava que estaria a dar o último concerto antes de um longo e forçado afastamento dos palcos. Hoje assinala o seu regresso nas Novas Quintas do Teatro Aveirense, às 22 horas, para apresentar o primeiro trabalho, "com muitas músicas novas e histórias para contar".
O rosto ilumina-se de entusiasmo. "A ria e os barcos tradicionais estão muito presentes em Aveiro, o que se adequa ao tema do disco". Terno, não hesita em assumir as saudades do público, com quem deseja agora partilhar a emoção.
Teatro Aveirense preparou auditório ao ar livre para o verão
José Pina, diretor do Teatro Aveirense, explica como a organização não parou durante o confinamento para levar a cabo um conjunto de ações quando que a Direção-Geral da Saúde permitisse. No dia 29 de abril, a programação foi retomada no Centro de Congressos durante as obras de renovação do Teatro, que deverão estar concluídas em setembro. Entre os dias 21 de julho e 22 de agosto, o espaço público, onde se inserem a Praça da República e a escadaria do Edifício Fernando Távora, também servirá de palco às artes performativas, ao cinema e a instalações artísticas, integradas no programa "Aqui Há Verão". "Um auditório ao ar livre" onde será hoje recebido Pedro Mafama. José Pina também promete dar continuidade às potencialidades do online e do streaming, que estiveram muito presentes nos últimos tempos.