Desde o seu primeiro filme, "Douro faina fluvial", mudo e rodado de forma artesanal, até às filmagens sobre o conto "Singularidades de uma rapariga loira", de Eça de Queirós, Manoel de Oliveira desenvolveu uma voz própria e portuguesa, pela qual deu, por sua vez, voz e vida aos portugueses e à maneira de se ser português. <a href="http://www.jn.pt/PaginaInicial/Cultura/Interior.aspx?content_id=4490303" target="_blank">O cineasta morreu, esta quinta-feira, aos 106 anos.</a>
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Como acontece com todos os grandes mestres do cinema mundial, a obra de Oliveira é pessoal e, assim, ao mesmo tempo integradora e alheia a correntes e tendências, a modas e a classificações e apresenta-se, de forma quase sempre inesperada, muito à frente do seu tempo no que significa e no que intenta profetizar: enuncia sempre um olhar específico sobre a existência e sobre a criação artística.
O pensamento e a forma de estar no mundo dos grandes autores cinematográficos, que se descobre a cada visão dos seus filmes, não é, muitas das vezes, compatível com as regras de mercado que regem a indústria cinematográfica, mas Manoel de Oliveira escolheu sempre interrogar a realidade e expor-nos as suas narrativas: os seus documentários e as suas ficções são, por si, a construção serena de uma imortalidade discursiva que raros alcançam.
Porque se escolhermos, por exemplo, a trilogia sobre a cidade do Porto, que nasce em "Douro faina fluvial", passa por "O pintor e a cidade" e culmina em "O Porto da minha infância", compreendemos, de uma maneira direta, acessível e estimulante, o pensamento de um dos mais importantes criadores da nossa contemporaneidade.
É a essa vida - e ao ato de criação e entrega que representa cada um dos filmes de um português ativo no dobrar do seu próprio século - que, esta quinta-feira, prestamos homenagem.