O Teatro Rivoli, no Porto completou este fim de semana 92 anos, com várias récitas gratuitas com a casa cheia. A rainha do programa foi a proposta "One Song: Histoire(s) du thêatre IV" da belga Miet Warlop.
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A proposta de Miet Warlop parece extenuante, durante uma hora vamos assistir a um concerto onde tocam sempre a mesma canção. Para qualquer pessoa presente no público, numa das récitas do fim de semana, a letra continua a ressoar como uma reza ou uma espécie de mantra coletivo "Knock, knock, Who´s there? It´s your grief from the past, not possible for all time sake, cause grief is like a rock, In your head, It´s hard, it´s rough".
Mas é preciso saber dar a palha ao animal. E Miet Warlop criou um embrulho genial. Numa alusão ao mundo desportivo cria uma apresentadora com três pernas e uma voz roufenha, deturpada por um megafone, estrategicamente colocada numa bancada juntamente com uma claque com adeptos de diferentes equipas. Há uma bandeira que não representa nenhum país em particular, mas que tem um hino ilógico interpretado no final. Na competição temos um vocalista, uma violinista, um teclista, um contrabaixista, um baterista e um cheerleader.
Joppe Tanghe tem de cantar enquanto corre na passadeira, Elizabeth Klinck tem de tocar violino equilibrando-se na trave. Simon Beeckaert toca contrabaixo, deitado de costas enquanto faz abdominais. William Lenaerts salta de um trampolim para tocar teclado. E o inacreditável Melvin Slabbinck corre de um lado para o outro pelo palco, enquanto toca uma bateria, descontruída sem falhar um tempo.
Milan Schudel é o cheerleader e é o único que vai dando respostas qualitativas à música. A comandar o concerto está um metrómono que vai mudando as batidas por minuto (bpm) criando desde uma batida punk, até uma valsa. O que permite a Milan Schudel dançar ballet clássico, danças dervixes ou danças acrobáticas. Os restantes membros incluindo os adeptos têm sempre a mesma coreografia em que muda apenas o tempo.
A repetição e a mudança entram num confronto constante, em que o exercício musical obriga a um estado de alerta permanente, do público e dos intérpretes.
Maarten Van Cauwenberghe foi o compositor da música que, ao longo de uma hora, revitaliza o público. A experiência de ouvir a mesma canção, uma hora, varia entre o agastamento e a enlevação. Os músicos numa espécie de transe avançam consistentemente e Milan Schudel faz um impressionante número dervixe com uma placa de gesso na mão que diz "Se".
Talvez esta seja a pergunta: Se desistirmos o que acontece? A exaustão acaba por traí-los um a um. O corpo falha e encharcados em suor começam a cair. Quantas bpm tem a sua emoção? No final será sempre isso que conta. Uma acertada aposta para o aniversário.