O artista americano apresenta uma retrospetiva no Whitney Museum, em Nova Iorque.
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Talvez tenhamos ouvido falar de Henry Taylor (n.1958) no seguimento do seu acrílico sobre tela, “The Times Ain't A Changing, Fast Enough!”, de 2017, sobre o brutal assassinato do afro-americano Philando Castile, a 6 de julho de 2016, no estado do Minesota (EUA).
O assassinato, por um polícia de ascendência latina, relançou nos EUA a questão da existência e consciência do racismo, no contexto de um país que elegeria Donald Trump (n.1946) como seu presidente, mantendo-se dividido e em clima de campo de batalha racial como já não víamos desde as lutas pelos direitos civis das décadas de 1960/70.
Henry Taylor nasceu na Califórnia e o seu irmão, Randy, foi um dos fundadores da secção dos Black Panther, partido revolucionário criado em 1966, do condado de Ventura. Reconhecemos-lhe as influências e a inegável essência política do seu trabalho. Contudo, não obstante, ter estudado artes no ensino regular, Henry Taylor não encontrou logo espaço de apresentação das suas propostas artísticas, num país e num contexto ocidental que, também nas instituições de criação e programação artística contemporâneas, foi (é ainda) eminentemente patriarcal, quase excluindo a representatividade de género, etnia e de tendências religiosas.
Henry Taylor acabou por trabalhar cerca de uma década como técnico de psiquiatria num hospital estatal dedicado à saúde mental e, depois de concluir a sua formação no prestigiado California Institute for the Arts de Los Angeles, em 1995, reforma-se da carreira na área da saúde e passa a dedicar-se, em exclusivo, a partir de 1997, à sua prática artística.
Talvez o contacto com os cidadãos com doença mental, o tenha sensibilizado para a liberdade da arte bruta e do poder da expressão das plasticidades neofigurativa, desvinculadas do pensamento neoconceptual ou, por oposição, dos hiper-realismos académicos. Certo é que a sua obra adquire uma linguagem única, representativa do mundo que o rodeia e, em particular, do quotidiano dos negros nos EUA.
Expande-se da pintura para o objeto tridimensional e para a instalação, que executa com recurso a objetos do quotidiano, apostando em mensagens fortes e de alerta contra o racismo e a discriminação.
Ao longo da última década, sobretudo, a sua obra tem merecido maior destaque e, até 28 de janeiro de 2024, o Whitney Museum, em Nova Iorque, apresenta a retrospetiva intitulada “B Side”. Esta exposição é sintomática do processo de reconhecimento que os grandes museus e galerias do dito ocidente levam a cabo no que respeita à pouca expressão que deram, nas suas coleções e programações, à produção artística de mulheres, negros e de todos aqueles fora do círculo de poder machista, caucasiano e judaico-cristão.
Temos abordado, neste espaço, diversos exemplos desse processo de reconhecimento de décadas, séculos de exclusão, levado a cabo com grande expressão internacional, sobretudo nos últimos anos, e que é uma das formas de reparação das desigualdades promovidas ao longo da nossa história comum.
A exposição de Henry Taylor não é, de resto, caso único por estes dias em Nova Iorque. No Whitney Museum apresenta-se também uma retrospetiva de Ruth Asawa (1926-2013), americana de ascendência japonesa que, no seguimento dos ataques a Pearl Harbor na II Guerra Mundial, viveu com a família nos campos de concentração para onde os norte-americanos relegaram os japoneses residentes no seu país. O Ser Humano que não apende com os erros dos outros e que opta, por reação hormonal e desprovida de consciência, pela vingança usando armas iguais. Temos ouvido tanto sobre isto nas últimas semanas!
Nas imediações deste museu, onde proliferam galerias, poderia ainda referir a exposição de Kandy G Lopez (n.1987), artista afro-caribenha que expõe na ACA Galleries obras em que refletem sobre a situação da identidade negra na contemporaneidade. Os exemplos multiplicar-se-iam, mas, no essencial, interessa compreender esta urgência de reconhecimento e reparação e a forma como a Cultura pode e deve estar na linha da frente do exemplo de como se constrói a equidade e diminuem desigualdades.