Um grupo de investigadores espanhóis concluiu que as sandálias encontradas há quase 200 anos na caverna dos Morcegos, na cidade espanhola de Granada, são o calçado mais antigo da Europa. Os acessórios terão mais de 6200 anos e fazem a ligação entre o período dos caçadores-recolectores e o dos agricultores neolíticos.
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A história da Caverna dos Morcergos de Albuñol, em Granada, remonta ao período pré-histórico do Neolítico na Europa e é um dos locais "mais excecionais" da época, devido "ao nível de conservação dos restos vegetais e orgânicos", segundo o projeto Morcegos. Uma iniciativa que junta 20 investigadores de várias áreas para analisar os objetos de esparto, encontrados na gruta, com recurso a métodos de investigação recentes.
O processo de investigação desta caverna tem atravessado os últimos séculos, com avanços e recuos. A gruta foi encontrada, em 1857, pelo proprietário de Albuñol, que descobriu o local coberto de morcegos e de guano, estrume de aves que pode ser usado como fertilizante e que os exploradores da época achavam ter chumbo. Naquela época, o fertilizante à base de excrementos de aves marinhas era muito valorizado e, por esse motivo, a caverna tornou-se na maior fonte da azoto da Peninsula Ibérica, explica o jornal espanhol "El País".
Restos humanos mumificados foram vandalizados
A parte mais fascinante da gruta está na parte do cemitério, com dezenas de restos humanos parcialmente mumificados e acompanhados de utensílios funerários, bem como de quatro cestos e 20 sandálias de esparto. Contudo, os especialistas defendem que esta exploração inicial não foi benéfica, porque os mineiros do século XIX saquearam tudo o que encontraram pela frente depois de se aperceberem da existência de um diadema de ouro num cadáver. Dos 70 corpos que se encontravam na gruta, apenas restou o crânio de um menino que está, atualmente, no Museu Arqueológico Nacional de Espanha.
O projeto Morcegos focou-se na análise dos cestos e das sandálias de esparto e chegou a uma conclusão surpreendente. O arqueólogo Francisco Martínez, responsável pelo estudo, referiu ao "El País" estar surpreendido pelo facto de "dois mundos tão diferentes como o dos caçadores-recolectores e dos agricultores do Neolítico estarem unidos pelo esparto".
"Algumas técnicas utilizadas como a cestaria costurada em espiral unem os dois períodos e ligam também a caverna a outros locais como La Draga, em Girona", contextualiza a vice-coordenadora do estudo, María Herrero.
Os especialistas conseguiram perceber que os cestos devem "ter cerca de 9500 anos, o que corresponde ao período do Mesolítico e dois milénios antes da agricultura na região", acrescenta Francisco Martínez.
Desta forma, os humanos que os fizeram eram caçadores-recolectores, o que torna estes objetos os mais antigos do sul da Europa, avança o estudo publicado na revista Science Advances.
No que toca às sandálias, os cientistas apontam para uma datação de 6200 anos, mais 700 anos do que as alpargatas encontradas na Arménia que eram consideradas as mais antigas da Europa.
O calçado era quase todo "de crianças, o tamanho corresponderia a um 37 e foram enterrados com elas”, explicou o investigador.
Esta descoberta confirma a tese defendida pelo arqueólogo Manuel Góngora y Martínez, que realizou uma expedição à caverna em 1868, mas não conseguiu o reconhecimento da mesma por parte da comunidade científica da época.
María Herrero alerta ainda para o facto de "só restarem as solas em quase todas as sandálias", mas algumas possuírem tiras assemelhando-se a "sandálias de praia".