Festival anual gratuito regressa em pleno e está a juntar milhares de pessoas nos jardins e Museu da Fundação de Serralves. Maratona de 50 horas encerra este domingo à noite.
Corpo do artigo
José Manuel é a prova viva da passagem do tempo no Serralves em Festa: 50 horas ininterruptas dão para muitas vidas. É sábado de manhã e José Manuel está deliciado com o neto a ver as desventuras de "Matilda" e "Gwendolyn", no Bosque das Faias. Horas antes estava com a mulher, no Prado, a assistir ao concerto de Rui Reininho e do seu projeto "20 mil éguas submarinas".
"Sinceramente não gostei assim muito, nem fiquei até ao fim... Ontem o que gostei mesmo foi de rever o filme do Oliveira "Douro, faina, fluvial", conta ao JN.
Como José Manuel, milhares de pessoas acorrem ao Serralves em Festa, o fim de semana anual com centenas de atividades culturais transdisciplinares em que tudo é gratuito. A Festa arrancou na sexta nos 18 hectares da Fundação e só termina domingo às 22 horas.
"Há sempre alguma coisa de que vamos gostar", conta Melanie Rocha que antes de começar o seu turno, é enfermeira, foi visitar a Festa. "Venho desde a primeira edição", garante. Mas, antes, afirma, um antes que agrega uma pandemia e um antes de ser a mãe de Laura de quase dois anos, a vida era outra. "Vínhamos ao final da tarde e ficávamos pela noite dentro, no Prado". Agora, o foco dos pais é dar à filha um "primeiro contacto, uma semente de arte e de cultura".
Não temos a prova, mas o ânimo parece ser o mesmo, Melanie continua a dançar, olhos a brilhar, agora à luz do sol. Talvez para lembrar aos pais que ali se passeiam que a diferença entre a noite e o dia é apenas a luz, a lua decidiu passear-se em plena manhã pelo Octógono de Serralves. A culpa é dos Seistopeia e da performance "Pescadores da lua", uma lua redonda levada pela mão de dois palhaços, emoldurada por bolas de sabão.
Um chamamento selvagem
Se na parte baixa de Serralves todo o ambiente é delicodoce, no Museu o som de batuques, tambores e pandeiros na porta, executado pelos visitantes no Drum Circle, tem a peculiaridade de um chamamento selvagem qualquer - e põe os corações a latejar em uníssono, preferencialmente a compasso de 3x4, como pede o maestro. Talvez por isso mesmo, a instalação "Entelechy", de Allora e Cazadilla, com um hipopótamo gigante no Foyer, pareça natural. A surpresa chega quando este descansa sobre as páginas do JN e o performer lê atentamente a nossa edição dos 135 anos.
Guilherme já veio "cinco vezes ao Serralves em Festa" e o que mais aprecia "é a Natureza, porque muitas vezes as pessoas não querem ver o que está à sua volta e ficam paradas em casa", conta. O pai, Paulo, diz que parte todos os anos para esta aventura trazendo apenas "um lanche" e esperando "as surpresas que o programa tem para oferecer".
O Serralves em Festa não deixa de ser uma aventura, à entrada é dado apenas um mapa, aos mais novos uma pulseira com um contacto de emergência. A partir daí, cada um tem de saber como se desenvencilhar e encontrar a sua tribo - e ali há mesmo de tudo para todos.
Acrobatas de Tânger
Como murmurava uma adolescente com um "crop top" da série "Stranger things": "Não sei bem o que é que as pessoas da minha idade fazem aqui". Passado o amuo inicial, descruzados os braços, deixa cair a máscara e mostra o sorriso metalizado quando vê um palhaço levar com um bolo catapultado em cheio na cara. Afinal mesmo quem tem incorporada uma costela de drama, também podem ser convencido pelos Bucráa Circus e pelo "El gran final".
Em 50 horas podemos ser muitas coisas: amuados, histéricos, esfuziantes ou comovidos. Para quem se quiser deixar levar, a Festa tem coisas imperdíveis. Duas ideias: Groupe Acrobatique de Tanger (meio-dia, 17 e 21.30 horas) e o concerto de Oren Ambarchi e João Pais Filipe (18.30 horas).