Boa figura não lhe faltava para ser um quebra-corações no grande ecrã. Mas foi sol de pouca dura a sua passagem pelo cinema na qualidade de ator. Nada que se compare aos longos anos passados atrás das câmaras, uma vida. Manoel de Oliveira, o homem que disse "quando deixar de filmar, deixo de respirar",<a href="http://www.jn.pt/PaginaInicial/Cultura/Interior.aspx?content_id=4490303" target="_blank"> morreu, esta quinta-feira, aos 106 anos</a>.
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O registo da conservatória marca 12 de dezembro de 1908 como a data oficial do nascimento. Contudo, foi no dia anterior que Manoel Cândido Pinto de Oliveira viu pela primeira vez a luz da sua longa existência. Nasceu no Porto, na freguesia de Cedofeita. Atleta na juventude, fazia as miúdas suspirar de amores quando ia mergulhar para as praias da Foz. Maria Isabel Carvalhais, com quem casou em 1940 e de quem teve quatro filhos, já o conhecia de então.
O gosto pelo cinema foi influência do pai, que o levava a ver filmes de Charles Chaplin, Harold Lloyd e de Max Linder. Daí lhe veio o desejo de ser ator cómico. A estreia no cinema deu-se como figurante: tinha 20 anos quando entrou no filme "Fátima milagrosa", do cineasta italiano Rino Lupo. A segunda aparição na tela foi como galã em "A canção de Lisboa" (1933), de Cottinelli Telmo, e só muito mais tarde viria a entrar em mais dois filmes: "Conversa acabada", de João Botelho (1982), e "Lisbon Story", de Wim Wenders (1994).
Em 1927, estreava na Alemanha "Berlim, sinfonia de uma cidade", documentário em que o realizador se inspirou para fazer o seu primeiro trabalho. "Douro, faina fluvial" foi exibido pela primeira vez, em Lisboa, em 1931. Oliveira já se mostrava avançado relativamente ao que se fazia em Portugal. Depois de outros documentários de que se perdeu o rasto, surge a primeira longa-metragem, "Aniki-Bobó, feita quase só com crianças e atores amadores. Estávamos em 1942 e ainda longe do êxito que o filme viria a alcançar.
Talvez devido ao fracasso comercial que foi "Aniki-Bobó", Manoel resolveu abandonar outros projetos de filmes e dedicar-se aos negócios da família, desde sempre ligada à indústria. Esteve afastado do cinema durante 14 anos e, quando regressou, não mais parou de filmar. Em 1963, foi preso pela PIDE, à conta de comentários que fez a propósito de "Acto de Primavera".
São dezenas os trabalhos que têm a sua assinatura. E é vastíssimo o leque de distinções e prémios (muitos, inclusivamente, atribuídos por instituições não ligadas ao cinema) que acumulou ao longo de todos estes anos, que fizeram dele o realizador mais velho do Mundo ainda no ativo. Duas vezes consagrado em Veneza pelo conjunto da sua obra (1985 e 2004), foi este ano merecedor da Palma de Ouro especial de carreira no festival de Cannes. Clint Eastwood, outro veterano da Sétima Arte, esteve entre os que lhe renderam homenagem.
Avô de Ricardo Trêpa, presença habitual nos seus filmes, nos últimos anos (como acontece em "Singularidades de uma rapariga loira", em rodagem), Manoel de Oliveira era um homem religioso e crente. Apesar de ter afirmado as suas dúvidas quanto à existência de Deus.