Álvaro Siza Vieira é o arquitecto português que acumula mais prémios internacionais. Ontem foi distinguido com mais um - o Prémio Luso-Espanhol de Arte e Cultura 2010. A notícia foi-lhe dada no mesmo dia em que a Universidade Técnica de Lisboa lhe atribuíu o Grau de Doutor Honoris Causa.
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O galardão luso-espanhol, no valor de 75 mil euros, foi instituido com a finalidade de distinguir quem, "por intermédio da sua acção na área das artes e cultura, tenha contribuído significativamente para o reforço dos laços entre os dois Estados e para um maior conhecimento recíproco da criação ou do pensamento".
Características estas que foram unanimamente reconhecidas pelo júri da presente edição como estando plasmadas na carreira daquele que é dos mais conceituados arquitectos protugueses. O Jornal de Notícias falou com ele, ontem, poucos minutos antes do início da cerimónia de Doutoramento Honoris Causa "pelo contributo que tem dado para o prestígio e dignificação da cultura portuguesa".
Há pouco mais de uma hora a Ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, anunciou que era o vencedor da terceira edição do Prémio Luso-Espanhol de Arte e Cultura. Os prémios ainda o surpreendem?
Este surpreendeu-me bastante, porque nem sequer sabia dele. Não contava nada. Acho que é demais.
Se calhar o seu trabalho justifica-o...
Pois. Deve ser isso, deve...
Já recebeu inúmeros prémios. Como recebe a notícia de que lhe foi atribuído mais um?
É sempre uma emoção. Além do mais estas são notícias que satisfazem o ego. Acho que é uma grande generosidade da parte do júri que os atribui.
Ao fim de mais de 50 anos de trabalho em arquitectura tem vontade de continuar ?
Sim. Como disse o Manoel de Oliveira uma vez: "tenho de trabalhar senão aborreço-me".
Quais são os seus projectos mais recentes?
Estou a trabalhar em vários. Neste momento, os que estão a ocupar-me mais, até pela distância, localizam-se na Coreia do Sul. Fiz um museu e um pavilhão de festas e tenho em curso uma casa de laboratórios.
O que pensa da arquitectura hoje?
É bom que se fale cada vez mais na arquitectura. Mas, ao mesmo tempo, penso que, quando se fala muito num assunto, é porque há problemas relacionado com ele.
Já identificou algum desses problemas?
Sinto-os na pele todos os dias. Eu e os outros arquitectos em geral.
Por exemplo?
Há muitas vezes uma pressão muito grande para se fazer o trabalho a correr. Imagine que há muitos casos em que tem mais tempo o júri de um concurso para deliberar sobre um projecto, do que um arquitecto para o fazer. Outro grave problema decorre da liberalização decidida pela Comunidade Europeia.
A liberalização não é sinónimo de maior capacidade e facilidade de trabalho?
Não, porque não há regras para tarifas, para prazos de contracto dos arquitectos. Portanto, a regra que impera muitas vezes, é a de quem faz pelo menor preço. E, depois, há também uma espécie de impulso irresistível para se produzir regulamentos. Muitos deles são um pouco absurdos. Há aqueles que colidem com os anteriores. E,às vezes, também acontece sair um novo regulamento quando já se está a meio de um projecto, obrigando a refazer tudo outra vez...
O facto de ser um dos nomes conceituados na arquitectura cria alguma espécie de pressão quando avança com novo projecto?
Não. As expectativas são as mesmas que tinha há 50 anos. Claro que há sempre uma certa ansiedade. Há sempre uma dúvida. O que não está mal porque, no fundo, nós, arquitectos, trabalhamos a partir das dúvidas.
Quando olha para os seus projectos iniciais alguma vez pensou que gostaria de mudar alguma coisa?
Se fizesse alguma coisa faria diferente e fazia mal. Já tive uma dessas experiências e não gostei. Hoje não há qualquer projecto que diga , e não é por presunção, que não gosto e que mais vale deitar abaixo. Reconheço-me em todos eles, uns melhores, outros piores, mas todos têm a minha marca.