A produção de espetáculos dedicados ao formato streaming é o novo paraíso dos amantes da música eletrónica e promete dar a conhecer os locais mais icónicos de Portugal através de DJ set sem público em paisagens e monumentos encantadores filmados a 360 graus.
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O castelo de Guimarães foi o cenário escolhido para o live set de anteontem do duo de Tech House, Mayze X Faria, pioneiros destas produções em território nacional com eventos a que chamam X Places.
Este apelo à transcendência que germina da comunhão entre a música eletrónica e as paisagens deslumbrantes tem um duplo ganho em tempos de pandemia. Por um lado, os concertos têm grande visibilidade internacional e, com um público-alvo jovem, são apetitosos para as câmaras e outras entidades divulgarem locais turísticos. Ao mesmo tempo, dão trabalho a DJ e produtores que, de outra forma, não teriam locais para atuar. Há ainda os produtores de vídeo, que têm uma tarefa essencial nesta experiência simultaneamente sonora e visual elaborada especialmente para ser vista num ecrã.
Em Portugal, a ideia foi lançada há menos de um ano no recôndito Monte de São Pedro Fins, em Amares, onde aconteceu o primeiro evento X Places. A terra que trouxe ao Mundo António Variações também foi o berço de João Macedo e Miguel Faria, o duo Mayze X Faria, que decidiram começar por divulgar o património local. Hoje já é moda.
Único e memorável
Nesse dia, atuaram em cima de um penedo a poucos metros de um precipício, ladeados por um apaixonante cenário verde onde as rochas espreitavam em todos os cantos e a vila sossegava ao fundo. Nas colunas, o house melódico disputava terreno com um minimal techno convidativo e frequentemente envolviam-se numa experiência única e memorável.
"Carregamos o gerador pelo monte acima", recorda Mayze, assegurando que faz questão de ser ele a montar o cenário. Admite que "é uma desvantagem" não sentir a energia das pessoas durante a atuação, mas assegura que este conceito "pode acontecer com público" quando isso for possível.
O segundo palco do X Places foi o imponente Navio Hospital Gil Eannes, em Viana do Castelo, onde a pictórica paisagem urbana rasgada pelo rio Lima foi transmitida em mais de 40 páginas especializadas de 16 países. Diz-se que a Câmara, que pagou o espetáculo, ficou encantada com a versão de "Havemos de ir a Viana", de Amália Rodrigues, com que o set terminou.
Em Guimarães, ao crepúsculo, o sol pintou de amarelo a torre de menagem do castelo onde nasceu Portugal enquanto o drone filmava a Zona Histórica da Cidade Berço e três câmaras acompanhavam cada movimento dos DJ ao longo de 50 minutos de sonoridades aveludadas e profundas, de batida house enrugada com laivos de dub e techno.
"Este conceito é muito interessante, conquista jovens, e nós precisamos de jovens na visita ao património", assinalava Isabel Fernandes, diretora do castelo, que disponibilizou o espaço ao terceiro palco do projeto X Places, que desta vez foi pago pelo "Garantir Cultura". O movimento inspirado na Cercle (ler ao lado) que agora começa a contagiar Portugal é uma aposta de artistas como Branko ou Gui Brazil. Por culpa da pandemia, pararam concertos e festivais, mas eles não.
Pirâmides do Egito foram palco lá fora
Os espetáculos produzidos para streaming já são comuns lá fora, sobretudo através da Cercle, a produtora francesa mundialmente conhecida pelo streaming de live set"s de música eletrónica em locais tão inusitados com as pirâmides do Egito, os alpes suíços, o deserto branco ou o interior de um balão de ar quente em plena travessia aérea.
"A Cercle é uma marca de amigos meus e eles abriram-me um bocado o jogo sobre a forma de fazer este tipo de eventos. Acabamos por criar algo que, na maneira de transmitir, é semelhante", explica João Macedo, aka Mayze.