O primeiro blockbuster do cinema foi realizado em 1975. Steven Spielberg duvidou que o conseguisse concluir, ganhou stress pós-traumático e chorou muitas vezes no barco. "Tubarão" é hoje um marco da cultural pop.
Corpo do artigo
Steven Spielberg vai revelar segredos e histórias inéditas sobre a produção do primeiro grande blockbuster do cinema, “Tubarão”, num documentário de Laurent Bouzereau que assinala o 50.º aniversário do filme.
Em “50 anos de Tubarão: a história definitiva dos bastidores”, que se estreia no serviço de streaming Disney+ este domingo, e no canal National Geographic no dia 14 de julho, Spielberg mostra imagens de arquivo que nunca tinham sido vistas e conta como achou que “Tubarão” ia acabar com a sua carreira.
O realizador confessa que sofreu de stress pós-traumático durante anos após a conclusão do filme e que chegava a deitar-se no barco da produção, “Orca”, para chorar.
“O que me surpreendeu mais foi o nível de intimidade que Steven tem com esta história e a partilha de como ficou traumatizado pelos desafios que enfrentou ao fazer o filme”, disse em entrevista à agência Lusa o realizador Laurent Bouzereau.
“A perspetiva humana é sempre comovente, relacionável e catártica. O que ofereço no meu filme é uma história de perseverança e ultrapassar as expectativas”, diz.
Bouzereau reconheceu que, em meio século, muito foi dito e contado sobre “Tubarão” (ou “Jaws”, no título original em inglês), mas o nível de detalhe e as imagens inéditas tornam o documentário diferente: além dos testemunhos de alguns dos maiores cineastas e estrelas de Hollywood, incluindo George Lucas, James Cameron, J. J. Abrams, Guillermo del Toro, Jordan Peele e Emily Blunt.
“Todos foram influenciados por ‘Tubarão’ de formas diferentes”, explica o realizador. Ele próprio emigrou de França para os Estados Unidos para cumprir o sonho de fazer cinema no sítio onde se passa o filme, a que assistiu quando era adolescente.
O luso-americano Joe Manuel Alves
O documentário explora também a influência tremenda que esta história teve na forma como as pessoas olham para os tubarões. Baseado no livro de Peter Benchley com o mesmo título, publicado em fevereiro de 1974, o filme gerou um interesse que antes não existia em torno do grande predador do oceano.
“É uma boa história, a velha história de como as pessoas reagem a ameaças que não conseguem controlar”, disse à Lusa Wendy Benchley, viúva do autor. “As pessoas nunca se tinham concentrado em tubarões antes disto. Quando o Peter publicou o livro, tocou em algo não só de medo mas também de fascínio, e impulsionou a ciência dos tubarões”.
O documentário inclui imagens e histórias do luso-americano Joe Manuel Alves, que desenhou o tubarão mecânico original e enfrentou dificuldades dramáticas para o fazer funcionar. Filho de emigrantes portugueses, Alves publicou o livro “Designing Jaws” ("Desenhando ‘Tubarão’") sobre o trabalho que fez e, numa entrevista anterior à Lusa, disse que continua a receber correio de fãs todas as semanas.
Os problemas com o tubarão "animatrónico" gigante do filme não foram únicos na produção. “Tubarão” excedeu em muito o prazo de filmagens e o orçamento que lhe estava destinado, chegando a duvidar-se que seria completado. A equipa, os atores e Steven Spielberg estiveram isolados na famosa ilha Martha’s Vineyard, ao largo da costa de Massachusetts, nos EUA, durante mais de cinco meses. O calendário original era de um mês e 25 dias de rodagem.
“Ele sentia muita culpa por estar muito atrasado e as pessoas ressentiam-se por não poderem ir para casa”, salientou Laurent Bouzereau. No documentário, Spielberg diz que o cerne do filme é voltar para casa, algo que Bouzereau identificou como um tema recorrente nos filmes do cineasta de 78 anos.
Um marco no cinema e na cultura pop
Mesmo com o sucesso astronómico que teve após a estreia, a 20 de junho de 1975, Spielberg continuou atormentado. E às filas intermináveis nos cinemas, e à loucura do merchandising, juntou-se um efeito inesperado: aventureiros começaram a matar tubarões no mar como troféus, querendo imitar um dos heróis do filme.
“Embora Steven tenha feito um filme de monstros, era uma metáfora”, disse Bouzereau. “Mas as pessoas tomaram-no de forma literal e houve um massacre de tubarões, algo que eu desconhecia”.
O realizador quis incluir esse transtorno no documentário e chamar a atenção para o trabalho de conservação que tem que ser feito, algo que é a especialidade de Wendy Benchley, uma conservacionista marítima que trabalha com a Wild Aid.
“Toda a gente retira coisas diferentes do filme e do livro, mas sabemos que criou fascínio com os tubarões e mais investigação”, disse. “É incrivelmente devastador pensar que 100 milhões de tubarões são mortos todos os anos para fazer sopa de barbatana e consumo da carne”.
Wendy Benchley espera agora que o documentário “50 anos de Tubarão: a história definitiva dos bastidores” renove o interesse pela proteção dos tubarões “e de como é importante salvá-los para manter o ecossistema e o equilíbrio dos oceanos”.
A viúva do autor também salientou que esta é uma história poderosa, passada de geração em geração, que mudou a história do cinema.
O documentarista Bouzerau tem a mesma opinião. “O filme não tem uma única ruga” disse, vincando que “foi um enorme marco no cinema, na cultura pop e até na política”, e que, 50 anos depois, continua a ser relevante.