Uma vaga de novas companhias alterou decisivamente a cena teatral do Porto no pós-25 de abril. E onde havia apenas dois grupos profissionais (Teatro Experimental do Porto e Seiva Trupe) e um só teatro a programar regularmente comédias e revistas (Sá da Bandeira), irromperam subitamente dez novos coletivos empenhados em ligar a cidade às revoluções teatrais do século XX.
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É esta história pouco conhecida que o livro de Mário Moutinho e Luísa Marinho vem iluminar. "O teatro semiprofissional no Porto", lançado no final do ano passado, regista uma "época de grande criatividade que marcou uma rutura com o que se fazia", diz o ator, encenador e animador cultural Mário Moutinho. E é também um relato sobre o modo como "a arte pode intervir na sociedade", nas palavras da jornalista do JN Luísa Marinho.
Sem se assumir como estudo académico, mas antes como recolha de pistas para um futuro trabalho mais aprofundado, o livro resulta de entrevistas, consulta de arquivos e também da memória de Mário Moutinho, que foi um dos protagonistas dessa aventura teatral que durou até ao final dos anos 1980.
O volume incide sobre dez companhias - TAI, TEG, Teatro 5, Água Acesa, Faúlha, Realejo, Roda Viva, Banzé, Art"Imagem, Caixa de Pandora - imbuídas de militância cultural e vontade de agitar, que a partir de 1974 traçaram diferentes vias para modernizar o teatro do Porto. Algumas das suas experiências fundaram caminhos para o que se entende hoje como teatro de marionetas, teatro para a infância, teatro de rua e café-teatro. E introduziram processos até aí praticamente inéditos em Portugal, como as criações coletivas, colagem de textos e adaptação de materiais não dramáticos.
E se aos primeiros espetáculos faltava ainda em consistência o que sobrava em fervor político, os cursos de formação e a persistência acabariam por dar origem a obras marcantes, como "Hoje começa o circo", da Roda Viva, ou "A bela e o monstro", do Realejo. Apenas um destes grupos viria a profissionalizar-se (Art"Imagem, que continua em atividade), mas do movimento saíram várias figuras que marcaram a cultura da cidade, como Isabel Alves Costa, Francisco Beja, João Lóio ou Victor Valente.