Foi mais um sucesso o 19.º concerto em Portugal do grupo liderado por Matt Berninger, que levou 8 mil espectadores ao Pavilhão Rosa Mota, no Porto, esta quinta-feira. Hoje e amanhã os músicos de Ohio atuarão no Campo Pequeno, em Lisboa.
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Ia já o concerto na reta final, em pleno encore, soava “Mr. November”, quando aconteceu algo invulgar: Matt Berninger, sempre elegante e desenvolto no seu fato escuro, desce do palco, aproxima-se dos fãs, deixa-se tocar e abraçar, tudo normal, mas depois penetra na multidão, escoltado por um segurança, avança pela plateia, anda em círculos, sempre a cantar, estende o passeio até uma das saídas, vem para trás, atravessa novamente o povo, que quase o engole, nunca deixa de cantar, encontra o caminho para o palco e finaliza a canção junto aos seus companheiros. Era a devolução do amor que os oito mil que esgotaram o Pavilhão Rosa Mota, no Porto, haviam dedicado às duas horas e meia de canções dos The National. E não haja dúvidas: com o preço corrente dos bilhetes para concertos, quem lá vai, vai por amor.
O pretexto do espetáculo era a apresentação dos dois “álbuns irmãos” lançados este ano: “First two pages of Frankenstein” e “Laugh track”. Mas, como o próprio Berninger brincou, era também um momento para cruzar várias épocas, incluindo o ”renascimento” e a “idade média”. Dessas eras longínquas vêm trabalhos como “Alligator” (2005), “High violet” (2010), “Trouble will find me” (2013) ou a obra-prima da banda de Ohio – “Boxer” (2007).
Olhando esta cronologia, que surgiu aleatoriamente no concerto – os primeiros três temas pertenciam todos a um dos álbuns deste ano, mas depois não houve qualquer ordem aparente –, percebe-se que é difícil criar separações claras entre as épocas: um refinamento geral, um aprofundar de certos temas e um investimento crescente nos arranjos serão os aspetos mais salientes na evolução da música dos The National. Um enriquecimento contínuo, para dizer tudo.
Sobre uma base de letras requintadas, que apelam mais à intuição do que ao raciocínio, ergue-se um som ora íntimo e sussurrado, como se se lessem epístolas privadas, ora épico e expansivo, tendendo ao universal. A presença dos metais – trompete e clarinete – acrescentaram luxo a uma construção já de si opulenta, carregada de detalhes e com várias temperaturas. A voz de Berninger encontra-se no apogeu das suas capacidades, profunda mas ágil, migrando entre a ‘spoken word’ e a erupção dramática.
Nos momentos mais rasgados, como nos versos de “Grease in your hair” – “I have no more feeling for it/ I have no more frame of mind” –, notaram-se, infelizmente, algumas limitações acústicas no recinto, com a voz de Berninger a sair estilhaçada. Nada que beliscasse o sucesso de mais uma visita da banda a Portugal (com os concertos de hoje e amanhã no Campo Pequeno, em Lisboa, sobem para 21 as atuações dos The National em solo nacional). Que tem a sua base de fãs em cidadãos na casa dos 40 e 50 anos, mas que vai convertendo os que acompanham os pais ou que têm amor suficiente para comprar o ingresso.