Instituições científicas e académicas estão nesta altura a recolher peças relacionadas com a covid-19 para construírem acervos museológicos.
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"Para ter uma boa história para contar do passado, tenho de agarrar o momento. É por isso que não paro", afirma, ao JN, João Neto, diretor do Museu de Farmácia, em Lisboa. O entusiasmo é grande, acaba de receber, através da Embaixada da Rússia, uma vacina Sputnik. É mais um elemento essencial para adicionar ao acervo que está em construção e que deverá documentar e ilustrar a pandemia de covid-19 espoletada em março de 2020.
Neste momento, tem cerca de três dezenas de peças: protótipos de ventiladores, entre os quais o Atena, viseiras, embalagens de álcool gel, os primeiros raios-X e até a aplicação Stay Away Covid. "Sou um Indiana Jones da Farmácia. A minha vida é caçar peças", assegura o responsável, que diz ter a responsabilidade de gerir uma coleção que vai desde "o Neolítico até à NASA".
Essa coleção deverá ter apresentações públicas no próximo ano, no Porto e em Lisboa. "Nessa altura, já deverá existir alguma serenidade. Isso vai dar-nos a capacidade de perspetivar uma boa história."
Diário fura fronteiras
A Universidade do Porto (UP) também tem feito uma recolha ativa deste tipo de material, explica Rita Gaspar, curadora do projeto do Museu de História Natural e Ciência, que arrancou em maio do ano passado.
Atualmente, a coleção já tem reunidos 50 objetos. Os dois últimos são particularmente interessantes: "Temos um diário que pertence a um estudante, que estava na Alemanha. Ficou retido durante uns tempos e foi viajando pela Europa, a tentar furar as fronteiras. É um registo totalmente pessoal", conta. Também foi incluído na coleção o portfolio de uma médica e fotógrafa, que "detalhou com um cunho artístico o teatro das operações".
Neste momento, há três núcleos distintos, diz. "O grande core são as soluções técnicas da comunidade UP e empresas de materiais de proteção para mitigação da pandemia". No segundo grupo figuram os testemunhos pessoais e, no terceiro, que é aquele tem menos peças, está "a resposta orgânica da comunidade, pessoas que se organizaram para dar e acelerara respostas, como as que fizeram máscaras.
Na coleção existem também elementos internacionais, como os testes doados pela Embaixada da Coreia do Sul. Na UP, também a Faculdade de Engenharia tem feito uma pesquisa e recolha ativa de peças para estes núcleos. As duas instituições apresentarão as coleções num congresso científico em setembro. Rita Gaspar defende que, neste momento, não seria bom fazer uma exposição. "As pessoas estão fartas da pandemia."
Serralves e Gulbenkian atentas
Instituições como a Gulbenkian, em Lisboa, ou Serralves, no Porto, contactadas pelo JN, esclareceram que ainda não adquiram qualquer objeto relacionado com a covid-19, mas reconhecem que poderá vir a ser uma tendência. Durante a pandemia nasceu o Covid Art Museum, um espaço virtual onde os artistas podem expor obras relacionadas com este período. O isolamento e o distanciamento social são os temas mais presentes, sobretudo em fotografia e em desenhos.