Há dezenas de edições dos pequenos contos do autor checo por onde começar. Editora Presença lançou uma nova versão da coletânea “O abutre e outras histórias”.
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Seria a primeira vez que entrava numa sala de aula da universidade quando, ao arranque, a professora questionou sobre as leituras de verão. Com 18 anos, tinha terminado o primeiro livro daquele que se tornaria, pelo impacto financeiro, mas também emocional, que causa, um vício. Tinha lido "O Processo", de Franz Kafka.
A reação foi de imediato espanto: "Começa com algo complicado. Percebeu alguma coisa?"
A memória conduz a este ponto: é provável que muitos tenham já utilizado a expressão "kafkiano" sem sequer terem passado os olhos por uma página do autor. Mais de 140 anos volvidos sobre o seu nascimento, Kafka continua a ter das narrativas mais atuais da literatura do século XX.
Para os fãs há um sentimento de injustiça quando o escritor é associado a algo demasiado complicado - tendo cunhado até o tal termo usado em diversas línguas -, o que impedirá muitos sequer de tentar.
Se há alguma recomendação que possa ser dada, é dar (mais uma) oportunidade a Kafka. Assim, neste verão, por que não tentar os contos do autor checo? Destaquem-se três que, além da leitura rápida, não têm narrativas intrincadas nem as longas descrições que dão nome sombrio ao estilo "kafkiano".
Em primeiro lugar, "Um artista da fome", narrativa em quatro contos que segue a história de um jejuador profissional. Ainda que comece no ponto alto da sua carreira, com pessoas a pagar para o ver, o artista nunca está satisfeito, debatendo-se com um vazio interior e com as razões superficiais e a incompreensão daqueles que pagam. Não são mais de 60 páginas.
Para, talvez mais tarde, dar início à leitura de um dos grandes romances, pode começar-se com "O Fogueiro". Foi o primeiro conto traduzido para uma língua estrangeira e constituí a primeira parte da obra "O Desaparecido". Trata-se de um fragmento (tem até esse subtítulo) de leitura simples, que aguça a vontade de continuar.
Para os adeptos de burocracia, perversão ou opressão em formato simplificado, "Na colónia penal" é um conto que segue a jornada de um homem numa ilha feita prisão. É uma crítica mordaz - e atualíssima - ao sistema prisional.