(LA) Horde traz ao Rivoli "Childs, Carvalho, Lasseindra, Doherty". Coreógrafa Marine Brutti diz ao JN o que vai ser.
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Felizmente, o coletivo francês (LA) Horde, reunião dos artistas Marine Brutti, Jonathan Debrouwer e Arthur Harel, tem-se apresentado regularmente no Teatro Municipal do Porto. Essa via láctea de fortúnio é devida a Tiago Guedes, anterior diretor artístico do TMP. Se em 2017, "To da bone" deixou uma forte marca impressiva pelo seu caráter experimental em torno da força da juventude, a sensação agudizou-se com o assombro que é "Room with a view", o abismo programado no Festival Dias da Dança (DDD) de 2021, quando o coletivo já tinha assumido a direção do CCN Ballet National de Marseille. Hoje e amanhã (LA) Horde - isto é, a tribo, a caterva, o bando indisciplinado estupendo - regressa ao Teatro Rivoli, no Porto, às 19.30 horas, com "Childs, Carvalho, Lasseindra, Doherty", um ambicioso e sôfrego programa.
São quatro coreógrafas de três gerações distintas: Lucinda Childs, norte-americana de 82 anos; Tânia Carvalho, portuguesa de 46 anos; Lasseindra Ninja, da Guiana, e Oona Doherty, irlandesa, ambas de 36 anos.
ser transgeracional
"O espetáculo é isto: uma ponte entre a violência social, a raça e os diferentes estilos coreográficos", vai dizer ao JN a coreógrafa Marine Brutti. "Nós não fazemos o marketing, mas pensar que é um programa feminino seria absolutamente redutor - e se fosse um programa apenas com homens, ninguém diria isso!", alerta Marine Brutti. "Ainda que levante muitas questões de género, no espetáculo temos as "sex sirens", temos um género neutro e temos também a masculinidade posta em causa", diz.
Este foi o primeiro programa em que o coletivo extraordinário decidiu fazer curadoria e "empoderar outros artistas" - em detrimento de se coreografarem só a si mesmas na companhia estatal que agora dirigem.
"Para isso quisemos um programa fluido e que, mais do que um programa da velha escola, fosse um programa transgeracional que incluía "Tempo vicino", da rainha da dança pós-moderna Lucinda Childs; "One of four periods in time", de Tânia Carvalho, uma artista com uma grande carreira e que mantém uma perspetiva barroca na sua dança, com preposições de uma dança formal", diz Marine Brutti. E continua: "E "Mood", de Lasseindra Ninja, uma mulher negra, trans pioneira do vogue em França, que é da nossa geração, alguém que conhecíamos do meio, víamos em workshops, mas que nunca teve o privilégio que nós estamos a ter de dirigir uma companhia". E mais ainda: "E a Oona Doherty, que nos trouxe o solo "Lazarus" com um belo e novo arranjo performativo", conta Brutti.
dança: nOVAS PREPOSIÇÕES
"Childs, Carvalho, Lasseindra, Doherty" foi um desafio para os bailarinos do CCN Ballet National de Marseille e também uma premissa desde que (LA) Horde tomou conta da instituição. "Trabalhar connosco fez com que eles tivessem de mudar a sua forma de trabalhar também. Depois desta experiência, eles são mais maduros e têm mais possibilidades de ter aprendido coisas novas e de dar novas experiências aos seus corpos. A maioria dos bailarinos tem uma educação formal em dança, de base clássica, portanto quando lhes apresentamos uma linguagem como a de Lasseindra é muito difícil para eles. Especialmente do ponto de vista interpretativo - porque lhe pedimos para explorarem a sua relação com a sensualidade e a sexualidade", diz Brutti.
E numa metáfora cinematográfica adita: "É um pouco como a Cate Blanchett, tanto podes ser uma rainha de coração gelado, como um elfo, como um condutor tens de ter a capacidade de mostrar diferentes personagens e ser o mais bonita e eclética, possível. E neste programa tens a oportunidade de passar por virtuosos, logo as caras e as forças anímicas, logo as "sex sirens" e depois uma tóxica energia masculina. E tudo isto sofrendo a transmutação em cena, sempre, sempre à vista do público".
Com este programa, há espectadores que virão pelo seu coreógrafo preferido, mas que terão a oportunidade de destapar o coração por outros. "A dança já é tão de nicho que não deixa de ser interessante que agora chamemos académica à Lucinda Childs, quando há 60 anos ela era uma punk! Há coisas boas em todos os tempos. Temos de criar a oportunidade de ter um momento juntos. E temos de acreditar no poder da transgeracionalidade", sentencia Marine Brutti.