O MUDAS, Museu de Arte Contemporânea da Madeira, apresenta uma exposição retrospetiva da artista natural do Funchal.
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As pessoas são sempre os seus lugares e, por mais que o mundo as tome, nunca deixam de ser raízes e de ter, na sua essência, as identidades plurais daquilo a que chama terra, a que chamam casa. Lourdes Castro (PT, 1930-2022), não obstante ter vivido mais de 25 anos em Paris e ser uma das mais aclamadas artistas portuguesas além-fronteiras, talvez nunca tenha, verdadeiramente, deixado a ilha da Madeira, o seu refúgio na natureza, a luz e as sombras desta relação de montanha e mar que marca a paisagem. E eu, que sou fã e estudiosa do seu trabalho há anos, precisei de vir à ilha, à Madeira, para a sentir pulsar por entre verde e mar, nas subidas e descidas da montanha, no mar que é fronteira mas também horizonte, para entender os seus herbários e compreender as sombras e a luz de Paris ou como se constrói uma linguagem que é sobre o que se camufla do humano, permitindo sentir o que nos está à pele.
Lourdes Castro nasceu no tempo do fascismo, mas teve a sorte de a família lhe proporcionar estudos de belas-artes em Lisboa e teve a ousadia de cedo perceber que onde não há liberdade, não há caminho. Viria mesmo a ser expulsa (1956) da ESBAL, pela sua não conformidade com o cânone académico de então. Já tinha sido a primeira aluna mulher a frequentar o liceu do Funchal. Não seria o artefacto de nenhum outrem, a impor-lhe destino. Fez-se à estrada e com o primeiro marido, René Bértholo (PT, 1935-2005) rumou a Munique, em 1957, onde já estava um português: António Costa Pinheiro (PT, 1932-2015). No ano seguinte, já em Paris, os três artistas com João Vieira (PT, 1934-200), José Escada (PT, 1934-1980), Gonçalo Duarte (PT, 1935-1986), Jan Voss (Alemanha, 1936) e Christo (Bulgária, 1935-2020), irão criar a revista e projeto KWY, as três letras que não fazem parte do alfabeto em português e que funcionavam como uma espécie de carta aos amigos, na referência ao tal “Ká Wamos Yndo” dos artistas exilados.