Foi no primeiro concerto que se anunciou o que seria a segunda noite do Festival CA Vilar de Mouros. “Bem-vindos ao nosso e ao vosso exorcismo”, professou a certa altura o vocalista dos RAMP, Rui Duarte. E o prometido foi devido.
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Durante uma hora em ponto, a banda nascida no Seixal em 1989 hipnotizou a pequena, mas entusiasta, multidão.
As noites de quarta e quinta-feira não podiam encaixar melhor numa certa analogia popular: foi como passar da água para o vinho. Se o primeiro dia do festival foi pautado pela curiosidade, diversidade e ecletismo (com parte do público a dar a entender que ouvia The Legendary Tigerman pela primeira vez ou a escutar Amália Hoje sem qualquer reação), a noite de hoje estava pensada, dirigida e destinada à sua própria cultura. Aquela que gritou, saltou, abanou a cabeça, levantou o braço e empurrou-se do início ao fim. Mais do que uma vez na mesma noite.
Vilar de Mouros fez-se a casa de “quem se veste de preto”. E Rui Duarte, dos RAMP, fez questão de passar uma mensagem durante a atuação: “E ao contrário do que muitos ainda pensam, quem se veste de preto é o mais ordeiro da sociedade, porque expurga todos os seus demónios na música”. Esta não foi a única vez que se dirigiu aos festivaleiros, numa atuação que teve tanto de energia como de partilha.
O "mais grande"
A abertura de RAMP foi feita aos poucos. Começou-se por “Catatonic”, faixa do mais recente álbum da banda de trash metal, e, daí em diante, como num escorrega inverso, um crescendo de força - passando por clássicos como “Black tie”, “Alone” ou “How”. E Rui Duarte não precisou do final apoteótico e sedento de mais (após a obrigatória “Hallelujah” concluir o exorcismo) para afirmar: “Este é o festival mais grande do Mundo”.
Da água para o vinho foi também a aparição de Fernando Ribeiro. Depois de quarta-feira subir a palco de cabelo lambido, blazer e coração bordado ao peito, metamorfoseou-se para esta noite surgir na sua versão Moonspell: calças e colete de cabedal, cabelo revolto.
A passagem do trash metal de RAMP para o metal gótico de Moonspell foi notável, não apenas através da audição, mas também na vibração violenta que passava pelo corpo (com o primeiro grupo a usar mais os graves puxados ao máximo). Ao passo que o grupo do Seixal cativou o público com o suor árduo, literal e metafórico, a banda da Amadora usou o seu maior triunfo: a base leal de fãs. Aquela que deu por terminada a atuação com um mar de palmas sobre o mote já típico, a bandeira de Portugal onde se lê “Alma Mater”.
A duas velocidades
O dia de abertura (ontem) foi marcado pelos GNR - destacados pela enchente que consigo trouxeram - e pelos Delfins - que conseguiram, com uma meia casa levar o público ao rubro. Imemorável foi a presença do coletivo Amália Hoje, com Sónia Tavares, que nunca conseguiu que os festivaleiros deixassem de cavaquear.
Na terceira e penúltima noite de Vilar de Mouros, amanhã, o palco junto ao rio Coura receberá os cabeças de cartaz Die Antwoord, aposta para que esta seja a noite da geração que viveu a juventude nos anos 2000. Antes atuam os repetentes Ornatos Violeta, que em 2023, levados pela onda de James, cabeça de cartaz dessa noite, deram um concerto histórico para uma casa esgotada.