“I think you’re freaky and I like you a lot" pode interpretar-se como "acho-te estranho, mas adoro-te imenso”. A frase é do refrão orelhudo de uma das faixas mais conhecidas de Die Antwoord, “I Fink U Freeky”, e é o resumo perfeito da paixão entre a dupla sul africana e o público de Vilar de Mouros na sexta-feira.
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Tal como qualquer amor de verão, houve, nesta breve história, intensidade, corpos em movimento e suor – tudo embrulhado numa certa dose de estranheza própria de quem atingiu a um nível de intimidade estratosférico sem um conhecimento profundo mútuo prévio. Neste terceiro dia de Vilar de Mouros, Die Antwoord pisaram um palco português pela primeira vez, mas não foi preciso mais do que duas músicas para que os corpos entrassem em ebulição e se começassem a tocar.
Os contactos foram entre o público, com os diversos mosh pit durante a pouco mais de hora e meia de concerto; entre o público e Ninja (pseudónimo de Watkin Tudor Jones, um dos elementos do duo) nos dois e longos crowd surfing que fez; e entre Ninja e a sua parceira, Yolandi Visser – que ainda que não se tenham tocado durante todo o concerto, demonstraram que a química é visível mesmo quando não é palpável.
Juras de amor
E se dúvidas houvesse que este é um amor de verão, lá para meio do espetáculo, o duo deu-nos mais uma prova: Ninja jura estar apaixonado por Portugal e decidido a se mudar de malas e bagagem para cá. Quantas promessas bêbedas de paixão, feitas no calor do momento, já não foram feitas e pouco depois desfeitas, mal termine o verão? Parece-me ser esse o caso.
Dizer que a paixão não se explica é um cliché (sejamos sinceros), mas há poucas formas de descrever a noite passada, pelo menos ao alcance de uma reflexão ainda a sentir o quente e suor do momento. Die Antwoord – que em africanês, língua-mãe da dupla, significa “A resposta” – foram a aparição mais inusitadamente positiva deste Vilar de Mouros. Ainda falta um dia completo de programação e arrisco-me a deixar já esta conclusão escrita na pedra.
Numa mistura entre hip-hop, psicadélico, eletrónica e umtoque de k-pop na voz infantilizada de Yolanda (sempre com os graves a testarem os limites da capacidade humana em suportar vibrações sonoras durante um concerto completo), o casal tem uma máquina de tensão, tesão e paixão bem oleada. Sabem como levar o público ao rubro e fazem dele tudo aquilo que querem – sem nunca descurar o galanteio próprio de uma manipulação (não disse que se encaixa numa intensa e fugaz paixão de verão?).
Os rendidos novos fãs
Se já em Crystal Fighters afirmava que Vilar de Mouros é, também e além dos fiéis, o local onde se fazem novos fãs, todas as dúvidas foram dissipadas com Die Antwoord. Para lá da linha da frente de claros e assumidos discípulos desta paixão (pelo menos a julgar pelo conhecimento rigoroso de todas as letras), poucos deviam ser os que os conheciam até esta noite de sexta-feira. Poucos terão saído de Vilar de Mouros com uma má impressão.
Mas, tal como numa paixão de verão, quando o verão acaba, fica a recordação, até talvez a saudade, mas não fica, certamente, uma conexão duradoura e estável. O espetáculo agarrou Vilar de Mouros pelos colarinhos e beijou-o sem mais não, mas dificilmente Vilar de Mouros irá para casa recordar, durante o ano, o que aqui ouviu. Esta foi a primeira vez que os sul-africanos estiveram em Portugal. Teremos de aguardar pela próxima vinda para confirmar o poder de Die Antwood conseguir levar o seu “freak show” a um nível seguinte – aí, sim, saberemos se foi uma paixão de verão ou se podemos apostar num “felizes para sempre”.