Nome grande do cinema independente, realizador norte-americano está em destaque na edição deste ano do Curtas Vila do Conde.
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Ícone do cinema americano independente, Whit Stillman é um dos convidados de honra do Curtas Vila do Conde. Autor de cinco longas-metragens, que já estão a ser alvo de uma retrospetiva, entre as quais a chamada trilogia autobiográfica – “Metropolitan”, “Barcelona” e “As Noites Loucas do Disco” -, o realizador de 73 anos estará à conversa com o público do festival na próxima quinta-feira, em torno de como fazer filmes de baixo orçamento, e voltará no dia seguinte, para apresentar um filme-surpresa. Ainda em Paris, onde passa grande parte do seu tempo, esteve a falar com o JN.
O que espera do público e dos cinéfilos portugueses que vão estar em Vila do Conde?
Estamos a preparar um programa sobre como fazer filmes de longa-metragem com pouco dinheiro e que consigam chegar ao público. Vou dar alguns exemplos, mas o mais importante é que as pessoas cheguem com as suas próprias ideias. A minha experiência é que, não fazendo nenhum filme há já algum tempo, se quiser fazer outro também não vou ter um grande orçamento.
A situação é a mesma hoje de quando começou, há trinta anos?
As coisas mudaram. Hoje é mais fácil, devido à tecnologia. Há vários casos de sucesso de filmes de baixo orçamento. Os irmãos Duplass afirmam ter feito uma curta-metragem com um orçamento de 3 dólares, com um telemóvel. Hoje já fazem longas e têm imenso sucesso.
Realizadores como Steven Soderbergh e Radu Jude já fizeram longas com telemóveis. Pensa que essa é uma via possível?
O mais difícil é ter um guião que se queira mesmo filmar. Depois, o que se quer é que a imagem e o som sejam o melhor possível. Em teoria, não sou adepto de fazer as coisas num estado de pobreza de meios, mas não há problema se conseguirmos criar uma estética com eles.
Foi o que aconteceu consigo?
No meu primeiro filme, “Metropolitan”, só tinha um tripé, não podia mover a câmara. A maior parte dos planos eram fixos, mas criou-se um estilo. O mais difícil num filme é saber exatamente o que não vamos fazer. Escolher o que se quer fazer e não fazer mais do que isso.
Também já trabalhou para a televisão. O que acha da eterna discussão entre cinema e televisão?
Lamento imenso ter feitos coisas para a televisão num determinado momento da minha vida. Sinto que perdi imenso tempo, mas temos de ganhar a vida. Trabalhei para companhias que tinham imenso dinheiro para comprar guiões, mas não tinham vontade de fazer a maior parte deles. Muita gente tem essa ideia de estar a escrever guiões que depois são enviados para um buraco negro.
Hoje parece já não haver uma grande diferença em fazer filmes para os cinemas ou para o streaming…
Para o consumidor, a televisão é boa. Eu prefiro ver um filme num cinema. Para um realizador, a televisão é muito corporativa, não está orientada para a estética. Para alguns realizadores independentes pode ser uma armadilha. Espero que o cinema se mantenha junto das plataformas que o apoiam em vez de tentar competir com elas. Funciona-se melhor quando a indústria está em baixo, quando temos de nos limitar ao básico.
Quando olha para trás, o que pensa dos seus filmes como um todo?
Tenho muitos arrependimentos e algumas satisfações. Lamento não ter feito filmes que não fossem apenas os meus filmes. Quando se fazem dois filmes iguais, assume-se que é isso que vamos fazer toda a vida. E foi o que fiz com os meus três primeiros filmes. Quando fiz o “Damsel in Distress” as pessoas não foram ver, queriam um quarto filme na linha do que já fizera. E eu gosto de aventuras, de Zorro, de Dumas, de James Bond. Mas tenho sempre dificuldade em montar filmes desse género.
Então quando é que vamos ter direito a novo filme.
Acabei de escrever um guião que uns produtores me propuseram. Foi o guião que demorei menos tempo a escrever, fiquei muito contente. Passei três horas a discutir a história com eles. Façamos figas. Pode acontecer muito rapidamente. Ainda tenho esse projeto de vida, “The Splendid Affinities”, uma versão moderna dos filmes de capa a espada, mas sei que não passa de um sonho irrealista.
Tem passado uma boa parte da vida no estrangeiro, como olha hoje para o seu país?
Espero que não voltemos a ter nada assim outra vez, que acabe com o homem que gerou esta situação. É possível que tudo isto tenha a ver apenas com este homem e que quando ele desaparecer esta situação não volte a acontecer. Tudo aquilo que de mal o resto do mundo dizia sobre os Estados Unidos e eu não acreditava tornou-se realidade. O que se passa na América é horrível, é assustador. Mas acredito que nas próximas eleições tudo volte ao normal.