Zorro volta aos ecrãs. “As injustiças deram-me vontade de pegar de novo neste justiceiro”
Há um novo Zorro, para ver agora no seu televisor, a partir de hoje, no canal TVCine Edition, a partir das 22.10 horas. Passada numa Los Angeles do início do século XIX, integralmente recriada em Espanha, tem o popular Jean Dujardin como protagonista.
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Há vinte anos que Don Diego pôs de lado a capa, a espada e a mascarilha, mas as injustiças levam-no de novo a montar a cavalo e espalhar o Bem à sua volta. O JN esteve em Paris a conversar com um dos criadores da série, Benjamin Charbit.
Já lhe devem ter colocado várias vezes a questão, porquê um outro Zorro neste momento?
A ideia veio do Marc Dujardin, o irmão mais velho do Jean Dujardin, e que é o produtor da série. Veio ter comigo com um duplo desejo, o de proporcionar um Zorro ao irmão dele, porque sabia que era uma personagem que ele gostava de encarnar e já tinha uma ideia de adaptação política.
Qual era a abordagem dele que lhe foi proposta?
Ele questionava o mito do super herói. Colocava a questão de perceber se o super herói não seria uma personagem muito populista, que resolve os problemas políticos pela força, o que corresponde a uma vaga de fundo que vemos pelo mundo fora, na Europa e nos Estados Unidos, e que é potencialmente inquietante.
Essa perspetiva política deu-lhe ainda mais vontade de escrever a série?
Foi exatamente isso. O nosso antagonista representa muito mais o capitalismo. Nas versões anteriores era mais o Estado corrupto, como na série da Disney dos anos de 1950. O Zorro tem um significado para os Estados Unidos diferente do que nós lhe demos na Europa quando o começámos a adaptar. É verdade que todas as injustiças que vemos à nossa volta dão-nos vontade de trazer de nova essa figura do justiceiro.
A dívida que aumenta tanto que já não pode ser paga é uma referência à crise financeira que abalou alguns países da Europa, como Portugal, há alguns anos?
Claro que sim, mas tratado sob o prisma da comédia. Fazer um Zorro em 2025 implicava que se falasse do mundo de hoje. Era preciso que Diego fizesse voltar Zorro, para lutar contra uma injustiça que fosse legal. Foi essa a evolução que quisemos dar à personagem de Diego, que não vestia a capa há vinte anos, e que a veste porque compreende que as leis são injustas.
Como é que dividiu o trabalho com o Noé Debré, o outro criador da série?
Há dez anos que nos conhecemos, partilhamos o mesmo escritório. Temos uma forma de trabalhar que é extremamente fluída. Propuseram-nos duas séries ao mesmo tempo, o “Zorro” e uma outra, e decidimos escrever as duas como coautores, mas onde cada um de nós seria mais responsável por uma delas, para que a identidade artística e estética fosse coerente. No caso de “Zorro” fui eu e ele foi o meu parceiro nesta viagem.
Quantas outras versões de “Zorro” viu antes de começarem a escrever?
Vi a série da Disney, claro que vi a versão com o Antonio Banderas. Vi o que tinha sido feito antes, desde o mudo, com o Douglas Fairbanks. Li o livro da Isabel Allende. Fiz esse trabalho de arqueologia, para perceber qual é que foi o denominador comum de todos os Zorros. E para me poder posicionar face a esse histórico.
O Jean Dujardin é muito popular, mas alguma vez teve alguma dúvida de que ele seria capaz de interpretar a personagem?
O Jean Dujardin é alguém muito importante na paisagem audiovisual francesa. Enquanto comediante, tenho uma enorme admiração por ele. Mandámos-lhe o guião do primeiro episódio e marcámos um almoço. Eu estava um pouco inquieto, porque não o conhecia pessoalmente, mas foi um encontro extraordinário. Ele tinha tido um prazer sincero a ler o texto e percebeu todas as nossas intenções. Funcionou muito rapidamente entre nós.
E o Jean Dujardin está muito habituado a fazer cenas de ação…
Ele fez ele próprio noventa por cento das sequências de ação. Foi outra coisa que apreciou muito no projeto, porque é um ator de exteriores. Adorou a ideia de ter de voltar a andar a cavalo. Trabalho imenso com um tratador. Aprendeu um pouco de espanhol, adorou ter esse ar de aristocrata. E trabalhou imenso as cenas de espadachim.
Além do Dujardin, o elenco é notável, com o Grégory Gadebois, o André Dussolier, a Audrey Dana.
A vantagem de ter o Jean Dujardin é que toda a gente quer contracenar com ele. O Grégory era uma evidência para nós e depois para o Jean. O que ele trouxe à série é extraordinário. No papel, o Sargento Garcia era alguém por quem eu tinha um grande carinho, mas nem acreditei quando o vi representá-lo. O André Dussolier já devir ter sido o pai do Dujardin noutra série, mas não estava livre. E trouxe toda a sua elegância e o cinimso da personagem. Tive muita sorte em ver encarnar estes papéis atores que há muito admiro.
Onde é que recriou esta Los Angeles do início do século XIX?
A série foi toda filmada em Espanha. Os interiores na região de Toledo, com as fazendas que trabalhámos com a equipa de decoração. E os exteriores em Alméria, onde foram rodados imensos westerns. Mas tivemos de reconstruir tudo, porque não resta praticamente nada da Los Angeles daquela época.
Como é que se garante a unidade visual e narrativa de uma série de vários episódios quando são realizados por diversos realizadores?
É uma boa questão. Tentei ser uma espécie de supervisor artístico, algo que se faz muito nos Estados Unidos mas é raro em França. Agradeço imenso ao Marc Dujardin, por ter aceite esta proposta. Escolhemos juntos os realizadores e ficou claro que iríamos fazer juntos a direção artística da série, para garantir essa coerência. Um dos realizadores fez os episódios 1 a 4 e outro do 5 ao 8, mas eu estive sempre lá a garantir essa unidade.
Como é que está o panorama das séries de televisão em França?
Começamos a sentir o efeito da chegada das plataformas americanas. Depois de um início um pouco caótico, onde toda a gente encomendava séries sem saber muito bem o quê, e nós criadores estávamos um pouco perdidos, agora sinto que as plataformas são mais claras no que pedem e são capazes de ir mais longe, com projetos mais ambiciosos. O ecossistema está a alcançar um certo equilíbrio. O frenesim das encomendas parou, mas vai-se mais longe nos riscos que se correm. E isso beneficia a qualidade das séries.