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"Parasite", do sul-coreano Bonj Joon-ho, venceu a Palma de Ouro da 72.ª edição do Festival de Cinema de Cannes.
Como fomos dizendo ao longo destes últimos dias, além do grande favorito, Pedro Almodóvar, havia dois ou três filmes que tinham também suscitado grandes paixões desde a sua exibição aqui em Cannes e que bem poderiam retirar ao cineasta espanhol a possibilidade de levar para casa a tão desejada Palma de Ouro.
Quando Antonio Banderas recebeu o Prémio de Interpretação Masculina, percebeu-se então que ainda não era a hora de Almodóvar. Assim, não surpreendeu a escolha do júri liderado por Alejandro ñarritu, tomada aliás por unanimidade, e que recaiu em "Parasite", do cineasta sul-coreano Bong Joon-ho.
Autor de obras de culto como "The Host", "Mother" ou "Snowpiercer", Bong Joon Ho é um mentor do género fantástico, que tão subtilmente utiliza no filme que lhe vale agora um dos maiores galardões do cinema mundial.
O filme gira em torno de uma família que vive numa cave, numa situação miserável, dependendo da internet que captam dos vizinhos e da desinfestação que é feita nas ruas. Mas esta família tem um plano. E aos poucos, cada um dos seus membros, marido, mulher, filha e filho, imiscuem-se numa família abastada, vivendo numa casa luxuosa, de construção moderna, e para quem vão ser governanta, motorista, professor de inglês e terapeuta. Só que os planos, mesmo no cinema, nunca funcionam como previsto...
O Grand Prix, uma espécie de prémio de consolação, foi para "Atlantique", da realizadora Mati Diop, uma coprodução entre França, Senegal e Costa do Marfim, que pelas suas debilidades, não estava nas previsões de ninguém. Mas parece que mesmo o júri terá de cumprir determinadas quotas e esta história de uma jovem que tem de casar com alguém que a família lhe impõe, e que mistura realismo com fantástico local de forma bastante primária e pouco convincente, acaba por ficar na história do festival de Cannes.
Mas as "bizarrias" do júri não se ficaram por aqui. Se o último filme dos irmãos Jean-Pierre e Luc Dardenne, "Le Jeune Ahmed", tem qualidades, não serão certamente as que lhes valeram o Prémio de Realização, com os belgas a regressarem ao estilo dos seus primeiros filmes, ao contar a história de um adolescente radicalizado que é seduzido pelos mais simples prazeres da vida.
O momento mais politizado da noite decorreu com a entrega do Prémio do Júri ex-aequo a "Les Misérables", do francês Ladj Ly e a "Bacurau", dos brasileiros Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. Enquanto o filme francês denuncia a violência policial nas ruas de um bairro da periferia de Paris, e o realizador recordou todas as dificuldades que teve em montar esta sua produção, os brasileiros, que apresentaram uma obra passada num futuro próximo, em evidente metáfora sobre o Brasil de hoje, salientaram que são trabalhadores da cultura e embaixadores do Brasil no mundo e que, como tal, merecem o respeito que não têm neste momento do governo brasileiro.
Numa outra direção, sentiu-se o desconforto com que Elia Suleiman recebeu uma Menção Especial do júri. Foi ainda mais minimalista que os seus filmes a subida do palestiniano ao palco, mas toda a gente sente que o seu filme, "It Must Be Heaven" - que recebera horas antes o Prémio da Crítica internacional - merecia muito mais.
Celine Sciamma, outra das favoritas, foi das primeiras a receber um prémio, mas ficou-se pelo Melhor Argumento, enquanto o Prémio de Interpretação Feminina foi para a britânica Emily Beecham, pelo seu trabalho notável no filme austríaco "Little Joe", de Jessica Hausner. A sempre esperada Camera d"Or, que premeia a melhor primeira obra exibida em todas as secções do festival, foi para "Nuestras Madres", exibido na Semana da Crítica, onde o guatemalteco César Diaz, com particular sensibilidade e mestria, denuncia o pouco conhecido genocídio ocorrido no seu país.
Fecha assim as portas a edição 72.ª do Festival de Cannes. O cinema continua e os filmes deste ano, no seu geral, fazem-nos ter confiança no futuro desta forma de entretenimento e expressão artística que tanto amamos.
Coprodução portuguesa premiada
Esta tarde já tinha sido anunciado que a coprodução portuguesa "Liberté", do realizador espanhol Albert Serra tinha vencido o Prémio Especial do Júri da secção "Un Certain Regard". O lado nacional da produção esteve a cargo da Rosa Filmes, de Joaquim Sapinho, que sublinhou que o "prémio, e os outros que temos recebido, significam um reconhecimento do trabalho desenvolvido e a afirmação da internacionalização do cinema português."
