
Tintim faz 90 anos
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Portugal foi o primeiro país não francófono a publicar Tintim. Foi em 1936, na revista "O Papagaio".
Há 90 anos, um certo Tintim, de partida para a Rússia de comboio, despedia-se prometendo enviar "postais, vodka e caviar". Era a primeira de muitas viagens do repórter mais famoso da BD, autor de uma única reportagem, então no "Le Petit Vingtième", um suplemento infantil de um jornal francês. Da Rússia soviética aos EUA, da China ao Peru, do Egito à Austrália, das ficcionais Bordúria e Sildávia à própria Lua (16 anos antes de Neil Armstrong), Tintin, primeiro com Milu, depois também com o Capitão Haddock, o professor Tournesol ou os detetives Dupond e Dupont, iria tornar-se num dos símbolos do século XX.
Da ingenuidade das primeiras aventuras, influenciadas pelas posições de extrema-direita do mentor católico do autor, à denúncia de todo o tipo de ditaduras e à afirmação de valores como a amizade e a igualdade, Hergé tornou-se um dos mais apreciados e copiados autores de banda desenhada de sempre, com uma obra que continua atual 90 anos depois da criação e 50 anos depois da última novidade, "Tintim e os Pícaros" (1976).
A legibilidade do traço, a qualidade narrativa, as doses equilibradas de aventura, ação, suspense e emoção, e um herói intrépido, sincero e que privilegia a amizade, são algumas das razões desse sucesso. E mesmo se a passagem ao cinema pelas mãos de Steven Sipelberg, fã confesso da obra de Hergé, tarda a ter a anunciada continuação realizada por Peter Jackson, mais de 250 milhões de álbuns vendidos, com o mercado chinês em crescendo nos últimos anos, dezenas de obras de análise e centenas de produtos derivados, revelam que a popularidade do herói de poupa e calças de golfe se mantém em alta.
Comemorações aquém
No entanto, as comemorações dos 90 anos ficam aquém do esperado. A Foundation Moulinsart, que gere os direitos da obra de Hergé, anuncia o lançamento, apenas em formato digital, da versão original de "Tintim no Congo", digitalizada, remasterizada e colorida para a efeméride, e o Musée Hergé, na Bélgica, uma exposição de originais deste álbum.
Outra edição é "Les Tribulations de Tintin au Congo", de Philippe Godin, um dos maiores especialistas na obra do criador de Tintin, uma versão comentada da aventura africana que nos últimos anos tem sido alvo de acusações de racismo e de promoção de maus tratos a animais, quase sempre por parte de organizações ou pessoas em busca dos seus "15 minutos de fama" à custa da obra de Hergé, ignorando que a obra reflete a forma de pensar da época em que foi concebida.
Portugal pioneiro
Mesmo não tendo desembarcado em Lisboa, quando o paquete que o conduzia ao Congo passou ao largo da capital portuguesa (na versão de 1931), Portugal foi o primeiro país não francófono a publicar Tintim. Aconteceu em 1936, no n.0º 49 da revista "O Papagaio", onde, pela primeira vez, a nível mundial, foi visto colorido, por artistas da própria revista.
No nosso país, onde continua inédita a versão a cores de os Sovietes, não haverá qualquer edição para assinalar a efeméride, mas uma publicação daquela versão única, já tentada mas nunca autorizada, faria hoje a delícia dos colecionadores de Tintin em todo o mundo.
