A ministra espanhola da Igualdade, Ana Redondo, explicou que a proposta do Governo é introduzir um novo ponto no artigo 43.º da Constituição, relativo ao direito à saúde, com a seguinte redação: "Reconhece-se o direito das mulheres à interrupção voluntária da gravidez. O exercício deste direito será em qualquer caso garantido pelos poderes públicos em condições de igualdade efetiva, assim como a proteção dos direitos fundamentais das mulheres"
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O Conselho de Ministros de Espanha iniciou esta terça-feira, 14 de outubro, o processo legislativo para incluir o direito das mulheres à interrupção voluntária da gravidez (IVG) na Constituição, concretizando um anúncio feito pelo primeiro-ministro, Pedro Sánchez, a 3 de outubro. O líder do Governo escreveu nesse dia na rede social X que o executivo espanhol vai "levar ao parlamento uma proposta para constitucionalizar o direito à interrupção voluntária da gravidez".
O anúncio surgiu depois de o maior partido da oposição, o Partido Popular (PP, direita), ter aprovado uma proposta apresentada na assembleia municipal de Madrid pelo Vox, de extrema-direita, relacionada com a IVG.
A proposta aprovada estabelece que em Madrid os profissionais de saúde têm de informar as mulheres que solicitam a IVG de um alegado "síndrome pós-aborto", que poderia levar ao consumo de drogas e álcool a pensamentos suicidas, assim como a um "aumento de cancros no aparelho reprodutor feminino".
Este alegado "síndrome pós-aborto" não existe e não está validado pela ciência, como reconheceu posteriormente o presidente da câmara, José Luis Martínez-Almeida, garantindo que os profissionais de saúde não serão obrigados a referi-lo às mulheres que pretendem abortar. O texto do Vox, aprovado pelo PP, dizia ainda que a IVG é "um grande negócio para a ideologia que o apoia e promove: o feminismo".
Também a presidente do governo regional de Madrid, Isabel Díaz Ayuso (PP), disse na semana passada que o executivo autonómico não vai elaborar a lista de médicos objetores de consciência no caso da IVG, como exige a legislação espanhola, e aqueles que não concordam que "vão para outro lado abortar".
Ayuso tem dito também que há em Espanha "um número atroz" de IVG, num país "em que faltam crianças", considerando que está em causa "um fracasso como sociedade".
"O PP decidiu fundir-se com a extrema-direita. Eles é que sabem. Podem fazê-lo, Mas não à custa das liberdades e dos direitos das mulheres", escreveu Sánchez na rede social X, em 03 de outubro.
Esta terça-feira, o Conselho de Ministros iniciou o processo para avançar com a proposta de colocar o direito ao aborto na Constituição e aprovou um pedido de parecer ao Conselho de Estado, o primeiro passo estabelecido na legislação de Espanha para uma mudança no texto constitucional.
Numa conferência de imprensa em Madrid após o Conselho de Ministros, a ministra da Igualdade, Ana Redondo, explicou que a proposta do Governo é introduzir um novo ponto no artigo 43.º da Constituição, relativo ao direito à saúde, com esta redação: "Reconhece-se o direito das mulheres à interrupção voluntária da gravidez. O exercício deste direito será em qualquer caso garantido pelos poderes públicos em condições de igualdade efetiva, assim como a proteção dos direitos fundamentais das mulheres."
Ana Redondo afirmou que é preciso "blindar" o direito ao aborto na Constituição face "à onda reacionária" atual em Espanha e no resto do mundo, que fez do corte dos direitos das mulheres "um campo de batalha" e tem também "reduzido a saúde pública".
A ministra considerou que a legislação da IVG não é suficiente, como já se provou em Espanha, onde governos regionais do PP, sobretudo aquele que têm apoio do Vox, têm avançado ou tentado avançar com medidas que limitam o acesso ao aborto, num país em que a tutela da saúde é dos executivos autonómicos.
Alterar a Constituição exige uma maioria de pelo menos três quintos do parlamento e esta não será uma "reforma simples", admitiu Ana Redondo.
O PP tem o maior grupo parlamentar e os partidos da geringonça que apoiam o Governo liderado pelos socialistas (e que estão potencialmente a favor da proposta) não representam três quintos dos deputados.
A ministra considerou que o importante nesta fase é "lançar o debate", prometeu diálogo com todos os partidos e apelou ao PP.
"No PP há duas almas, uma alma que provavelmente se juntaria à maioria para a reforma da Constituição e outra que se junta à extrema-direita. Não vamos dar um passo atrás. Apelo ao sentido de Estado do PP, merecemos este reconhecimento constitucional, espero que o PP esteja à altura desse desafio", afirmou.
A direção nacional do PP, liderada por Alberto Núñez Feijóo, demarcou-se das declarações da líder do partido em Madrid (Ayuso), mas numa primeira reação ao anúncio de Sánchez rejeitou a possibilidade de apoiar a inclusão do direito à IVG na Constituição, o que inviabilizaria a sua aprovação.
França é atualmente o único país que reconhece de forma explícita o direito à IVG na Constituição, na sequência de uma alteração ao texto introduzida no ano passado. A atual lei do aborto em Espanha é de 2010 e estabelece o acesso gratuito à IVG e a pedido da mulher até às 14 semanas de gestação. Por motivos de saúde da mulher ou do feto, a IVG pode ser solicitada até às 22 semanas. Em caso de doença e anomalia extremamente grave do feto pode ser feita após este prazo.