A primeira mulher a correr a Maratona de Boston voltou esta segunda-feira à prova que mudou a vida das mulheres no atletismo. Com mais 50 anos, mas a mesma determinação. E o mesmo dorsal: 261. Só para ela. O número nunca mais será usado naquela maratona.
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Em 1967, K.V.Switzer tinha 20 anos, era estudante de jornalismo na Universidade de Syracuse e nada, nesta frase ou nas iniciais, indica aquela sua pequena-grande característica que a colocava oficiosamente fora da Maratona de Boston. K. vem de Kathrine. Kathy era uma mulher e, apesar de não haver nenhuma regra escrita que impedisse uma mulher de correr, havia a regra do preconceito. Porque, que diabo, uma mulher não tinha capacidade para aguentar tamanha dureza.
Inscreveu-se com K. porque estava farta de soletrar o nome a que um funcionário do registo civil roubara um E. Com o número de dorsal 261, Switzer esgueirou-se na partida com a ajuda de dois amigos e desatou a correr. Poucos quilómetros depois, o diretor da prova agarrou-a pela camisola para tentar que saísse da prova. "Sai da minha prova e devolve-me o dorsal", gritava Jock Semple, único pormenor que não sobressai da foto mais famosa da história da maratona. De fato, esbaforido, Semple foi impedido nos seus intentos por outros atletas, que escoltaram Kathy até à meta, às 4:20 de prova.
"Sinto-me profundamente agradecida a este homem enfadado, porque mudou não só a minha vida mas a de milhões de mulheres. Por muito que lhe custasse, faz mais do ninguém pelas mulheres atletas, porque criou uma imagem que se converteu num ícone dos direitos das mulheres", disse Kathy ao "El País", numa entrevista concedida há quatro anos.
A verdade é que Switzer não fora a primeira. Em 1966, Roberta Bingay Gibbs já completara Boston, mas sem inscrição. Mas as mulheres só foram oficialmente autorizadas a inscrever-se naquela prova em 1972, cinco anos após o episódio, e só entraram para essa modalidade dos Jogos Olímpicos em 1984.
Do seu lado, Kathy insistiu: fez mais de 30 maratonas e até venceu a de Nova Iorque em 1974, com o tempo de 3:07.29. Inspirada no seu dorsal, formou a clube de corrida 261fearless (sem medo), o nome que a guiou esta segunda-feira, com o seu sorriso de 70 anos e uma incrível vontade de vencer.