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Tricampeão Leixões é o clube mais bem-sucedido em Portugal. Equipa vai sofrer várias alterações e o treinador está de saída
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Figuras da mitologia presentes em lendas que envolvem o mar, as sereias sempre fizeram parte do imaginário de cada um. No entanto, essas nunca ninguém as viu, mas a verdade é que há sereias de carne e osso que têm levado o Leixões a dominar o voleibol feminino em Portugal.
O emblema histórico de Matosinhos é o que soma mais títulos de campeão na modalidade. Ao todo são 18, o dobro de Benfica e Castêlo da Maia, ambos com nove, tendo o último sido conquistado há poucos dias, diante do AVC Famalicão. As sereias do Mar são tricampeãs nacionais, tendo dado início ao percurso vencedor em 2016/17, época em que colocaram um ponto final num jejum de 25 anos. "É um motivo de orgulho. Somos a equipa mais titulada no voleibol feminino e honrámos os pergaminhos do Leixões", afirma Jorge Moreira, presidente do clube que detém o recorde nacional de 11 campeonatos consecutivos nas décadas de 1970 e 1980. "Este título é especial porque foi conquistado num ano muito difícil. Houve muitas lesões e problemas organizativos. É o campeonato da superação", exulta José Chaves, responsável pelo voleibol do Leixões.
Mário Martins é o treinador responsável pelo sucesso, tendo assumido o comando técnico há cinco anos. "Nunca tinha treinado uma equipa feminina. Decidi que não ia tentar perceber as mulheres e que ia treinar como treinava os homens, caso contrário sabia que sairia a perder", afirma, com boa disposição. "A derrota na final no primeiro ano, ao quinto jogo, foi algo que nos doeu muito. Mas permitiu-nos ter mais ambição e conquistar tudo o que conquistámos. Neste cinco anos a equipa melhorou muito, tornou-se mais consistente e o sucesso está à vista: três títulos de campeão e duas Supertaças", refere o técnico que está de saída do Leixões.
Adivinha-se que com ele saiam várias jogadoras, entre elas a capitã Catarina Costa que decidiu terminar a carreira, pelo que o plantel na próxima época deverá sofrer muitas alterações. "É o fim de um ciclo, mas a ambição será a mesma. Vamos honrar a camisola do Leixões e lutar pelo título", garante o presidente Jorge Moreira. Já o diretor José Chaves assegura que a aposta na formação é para continuar, dando o exemplo da utilização regular esta época da líbero Beatriz Basto, de apenas 17 anos e já convocada para a seleção sénior absoluta. "O Leixões sempre foi um clube formador e vamos juntar às atletas mais jovens outras com experiência. O objetivo será ganhar jogo a jogo".
Juliana Rosas: de rainha dos vices a tetracampeã
Presente nos três campeonatos consecutivos ganhos pelo Leixões, Juliana Rosas somou o quarto título de campeão seguido, pois o primeiro foi alcançado pelo AVC, em 2016. Aos 34 anos, a zona 4 atravessa a fase mais titulada da carreira, mas nem sempre foi assim. "Conquistei o primeiro campeonato aos 30 anos, quando já jogava há 20. Costumava dizer que era a rainha dos vices, mas agora estou a conseguir os títulos, que são a cereja no topo do bolo. Contudo, o que é realmente importante é o processo de treino, evoluir, aprender a saber jogar melhor. Foi isso que nos levou a ser campeãs". E o facto de saborear o sucesso no Leixões não a deixa indiferente. "Este clube é muito especial, assim como esta equipa. Além disso, temos adeptos que vibram connosco todos os jogos desde o início da época. Não há palavras". Quanto ao futuro, para já "é uma incógnita".
Catarina Costa Capitã põe ponto final na carreira
Aos 36 anos, Catarina Costa decidiu deixar de competir e dar por terminada a carreira no voleibol. "É uma decisão muito pensada. Não foi fácil tomá-la porque ainda me sinto bem fisicamente para jogar mais alguns anos, mas achei por bem sair agora. Saio no melhor clube e com três títulos de campeão consecutivo. Saio em glória", sublinha a zona 4. "Agora vou ficar a acompanhar as minhas companheiras todos os fins de semana quando começar a próxima temporada. Não vou jogar nas veteranas", atira, com boa disposição. Responsável por capitanear o Leixões nas três épocas em que o clube foi campeão, Catarina revela o segredo do sucesso. "A união, a amizade e a alegria que temos em jogar fez a diferença num grupo especial. O Leixões é uma equipa mítica, com mais títulos conquistados no voleibol nacional e foi uma honra imensa ter sido capitã".
Eduarda Duarte Médica que passa receitas para o título
O profissionalismo não é uma realidade nas tricampeãs nacionais, pelo que as jogadoras têm de mostrar jogo de cintura para conciliarem o voleibol com os respetivos empregos. O amor pela modalidade leva a enormes sacrifícios, como é o caso da líbero Filipa Diaz, que joga no Leixões mas estuda Medicina em Coimbra, a mais de 100 quilómetros de distância. Um caso que não é estranho à central Eduarda Duarte, 25 anos, médica no Centro Hospitalar do Porto. "Não é fácil. Vou trabalhar todos os dias, depois vou a correr para os treinos e não tenho muito tempo para descansar. Mas o esforço vale a pena. Jogo voleibol desde os oito anos e nunca deixei a modalidade", sublinha. Por isso, Eduarda, olha para o terceiro "título de campeã nacional como a recompensa de um enorme esforço pessoal, assim como um grande trabalho de equipa".
Mário Martins: técnico tricampeão deixa herança pesada ao sucessor
Ligado ao voleibol do Leixões há mais de três décadas, Mário Martins estava longe de imaginar que em 2014 estava a assumir o maior desafio da carreira quando foi convidado para treinar a equipa feminina, depois de tantos anos ligados ao masculino. Em cinco anos, o técnico de 45 anos levou as sereias a quatro finais. A primeira, em 2015, perdeu para o Porto Vólei, mas em 2017 foi contra esse mesmo adversário que iniciou a caminhada triunfal do tricampeonato, seguindo-se as vitórias nas finais seguintes ante o Clube K e o AVC. "É um orgulho que não me cabe no peito. Entrei no Leixões com 13 anos, já lá vão 32. Nunca pensei que um dia fosse ser treinador de uma equipa sénior no clube do meu coração, muito menos ser tricampeão e ter duas Supertaças conquistadas. Nem nos melhores sonhos imaginava ser possível viver o que estou a viver", revela.
O treinador optou por não continuar no cargo e está prestes a sair do Leixões, pelo que admite que "este pode ter sido o culminar de um trajeto muito bonito porque não é fácil manter o nível, pois o clube não tem uma capacidade de investimento grande e a equipa deverá ser diferente no próximo ano". Assumindo-se "viciado no treino e no voleibol", Mário Martins diz ter "vários projetos". "O primeiro é a família, pois é a grande sacrificada por esta minha paixão ao longo deste anos. Por isso, neste momento meu maior projeto é descansar um bocadinho", diz, embora abra a porta à possibilidade de abraçar em breve um novo desafio. "Nunca podemos dizer que vou ficar por aqui".
