Novo selecionador de Portugal fez trabalho invisível durante sete anos e mudou mentalidades na Bélgica. Mudou o futebol amador, feminino, a formação e melhorou as infraestruturas.
Corpo do artigo
A passagem de Roberto Martínez pelo comando da Bélgica está longe de ter apenas como reflexo os bons resultados dos "diabos vermelhos" em três das quatro fases finais de Europeus e Mundiais disputadas entre 2016 e 2022. Por trás da cortina, o técnico espanhol fez um trabalho de base na Real Federação Belga (RBFA), ao nível do futebol amador, da formação, do setor feminino e das infraestruturas, que deixou um legado para o futuro. Fonte da RBFA afirmou ao JN que Martínez teve "um grande impacto" no futebol belga e deu "luz verde a uma série de medidas importantes", que mudaram a modalidade no país.
"Para além de selecionador, ele também era diretor-técnico. O legado que deixou vai servir-nos durante anos e anos", sublinhou.
Em conversa com o nosso jornal, a referida fonte detalhou algum do "trabalho invisível" que o novo selecionador de Portugal fez durante quase sete anos. "Ele percebeu que a base de recrutamento do país era muito pequena e que a solução podia vir do futebol amador. O nível físico dos jogadores desses escalões era horrível e foi feito um trabalho que permitiu aos clubes das divisões amadoras utilizarem gratuitamente preparadores-físicos da federação. Isso foi feito com dinheiro que a Bélgica ganhou no Mundial 2018", revelou, aludindo aos 24 milhões de euros recebidos pela RBFA pelo terceiro lugar obtido na Rússia: "Quem podia dar luz verde para este tipo de projetos era Roberto Martínez e ele concordou logo. Além disso, ia a jogos amadores para ver o nível dos jogadores. Nenhum selecionador belga tinha feito isso antes".
Na formação, esse trabalho refletiu-se na elaboração de uma seleção dos melhores jovens sub-16 do futebol amador. "Por exemplo, metade dos jogadores da seleção que esteve na Rússia não estava num clube profissional aos 15 anos. Fizemos uma seleção de 20 jovens, que vivem como se fossem profissionais. Vão para a escola, dormem numa residência. Treinam uma ou duas vezes por dia, têm psicólogo, preparador-físico, médico, nutricionista. O objetivo é ter no mínimo um jogador dessa seleção num clube profissional. Após cinco meses, já temos três, dois no Leuven e um no Charleroi", conta, acrescentando: "Antes, o dinheiro servia para tapar buracos ou para pagar estágios, mas Martínez quis que esse dinheiro voltasse para o futebol. Ele é que dava a última palavra".
Nas infraestruturas, o técnico catalão contribuiu para "melhorar a qualidade do centro de treinos" da seleção belga, em Tubize, onde foram construídos "mais campos". As condições do hotel aí existente foram "melhoradas", assim como a "qualidade dos balneários".
Com Roberto Martínez ao leme da seleção masculina, a Real Federação Belga passou igualmente a apostar muito mais na seleção feminina, que no ano passado chegou aos quartos de final do Campeonato da Europa realizado em Inglaterra. "Ele desenvolveu muito o futebol feminino. Foi feita publicidade, captação, para melhorar a qualidade de quem começou há menos tempo. Aumentou-se o número de treinos", afirma fonte federativa. "A Bélgica é um país pequeno. É fácil juntar as jogadoras e é isso que acontece agora, para subir o nível. Segundo o coordenador do futebol feminino, a Bélgica é, neste momento, o país da Europa que mais investe na captação de jogadoras", acrescenta.