Salvador Cabañas foi estrela no futebol sul-americano até um tiro lhe roubar a carreira. Agora vende pão com uma bala na cabeça.
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"Não guardo rancor à pessoa que me deu o tiro. Foi graças a ela que me dei conta de que a minha ex--mulher só estava comigo por dinheiro e que os meus amigos me abandonaram quando o dinheiro acabou. Cada dia, agradeço por estar vivo e percebo que o dinheiro não é tudo na vida. Digo com orgulho que vendo pão".
Há sete anos que o autor deste desabafo vive com uma bala na cabeça. Antes daquele traumático 25 de janeiro de 2010, era um dos jogadores mais consagrados da América do Sul, internacional paraguaio, uma estrela no México, um dos nomes a ter em conta no Mundial de 2010 e vivia desafogado na esperança da ida para um colosso europeu. Hoje, é padeiro.
Tanto tempo depois, Salvador Cabañas ainda guarda dentro dele alguns pormenores do incidente naquela discoteca da Cidade do México que lhe mudou a vida. Sabe-se que, após troca de palavras pouco amigáveis, um traficante de droga sacou de uma arma e atirou à cabeça do interlocutor. Falhou-lhe, por milímetros, as zonas vitais do cérebro, mas sobreviver teve custos para Cabanãs, agora com 37 anos.
Desde logo, ninguém lhe devolve os quatro meses que passou no hospital. Já para não falar do despertar demasiado doloroso. A mulher, mãe das duas filhas do ex-jogador, coligou-se ao empresário e hoje ambos respondem em tribunal por, supostamente, terem dado o golpe do baú enquanto Salvador fugia da morte em camas hospitalares. Amigos, esses, desapareceram ainda mais depressa do que apareceram. O futebol? Uma miragem a esfumar-se no horizonte.
É verdade que Salvador Cabañas ainda tentou recuperar-se pela bola. Clubes das profundezas dos futebóis paraguaios e brasileiros abriram-lhe as portas, mas as limitações físicas do "el Mariscal", provocadas pelo tiro, logo lhe amansaram os ânimos. Definitivamente.
A custo, Cabañas rendeu-se às evidências, mas não virou costas à vida. Reergueu-se pelas mãos parentais, ajuda na padaria familiar e vai piscando o olho a um regresso ao futebol profissional através do título do treinador. Talvez Confúcio pensasse em Cabañas quando, cinco séculos antes de Cristo, defendeu que "todos temos duas vidas e a segunda começa quando percebemos que só temos uma".