Carlos Freitas, 53 anos, é um dos novos rostos do V. Guimarães esculpido pelo presidente Miguel Pinto Lisboa. O diretor-geral do clube minhoto chegou ao castelo com uma vasta experiência no currículo, iniciada em Alvalade quando ajudou a desenhar os plantéis que dariam os dois últimos títulos de campeão nacional aos leões. Contratou César Prates, André Cruz e Mário Jardel, entre outros nomes grandes. Aventurou-se no Braga, no Panathinaikos (Grécia), no Metz (França) e, mais recentemente, na Fiorentina (Itália), onde foi um dos responsáveis pela venda de 150 milhões de euros em passes de jogadores. Para trás, ficou uma carreira no jornalismo.
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O que foi preponderante para abraçar o V. Guimarães?
A forma como o presidente me abordou, a transmissão de ideias e a grandeza do clube. Admiro o Vitória desde jovem. Era um aluno da Escola Secundária de Benfica que faltava às aulas para ver jogos europeus do Vitória e o triunfo diante o Groningen, por 3-0 [1986/87], permanece na minha memória. Nessa altura, a equipa era entusiasmante e o ambiente que se podia ver pela televisão era muito diferente daquilo que era a maioria dos clubes.
Está habituado a lidar com a pressão. Já a sentiu no V. Guimarães?
Tive formação neste tipo de carreira e num clube [Sporting] em que a pressão nascia nos primeiros dias das épocas. Podia-se entrar em crise nos jogos amigáveis. Pressão é algo que é inerente ao meu perfil de profissional.
Tem responsabilidade de contratar bem para que o clube possa vender bem. Está satisfeito com o plantel construído num curto espaço de tempo?
Acho, com a mais firme das convicções, que é um plantel que oferece uma ótima capacidade de resposta para aquilo que são as ambições nesta época desportiva.
A experiência no estrangeiro abriu-lhe portas nomeadamente no mercado francês. Trouxe Lucas Evangelista e Poha e dois jovens para os bês. É um mercado a explorar?
É um mercado que, provavelmente, consegue formar quatro seleções de sub-21 do mesmo nível. E tem um potencial económico/desportivo muito interessante.
Disse, recentemente, que no V. Guimarães há uma história para escrever. Quer explicar?
Os clubes trabalham cada vez melhor, têm treinadores muito preparados e fazem trabalho de scouting. Mas poucos clubes têm a força genética do Vitória. A ideia que me entusiasma é ajudar a consolidar um processo de crescimento, sem objetivar o teto desse crescimento. Numa questão de lógica, sonhar com o título é um objetivo longínquo. No entanto, estar presente de forma sistemática em competições europeias ajuda e muito a crescer. Queremos que essa linha de crescimento seja contínua.
Mas o V. Guimarães pode sonhar com a conquista de troféus este ano?
Há a ambição de entrar em todos os estádios para ganhar. É uma ambição inerente a todas as pessoas que trabalham no clube. Faz parte do ADN.
Se a SAD tivesse um investidor externo, como é o caso do Famalicão, acredita que seria o passo certo para o V. Guimarães sonhar com o título de campeão?
Não acredito em fenómenos casuísticos e acho que as coisas acontecem sempre fruto de qualquer coisa. A base do Vitória é muito diferente da esmagadora maioria dos clubes. Tem uma cidade que respira e é apaixonada pelo clube e isso nota-se no estádio. Colocar mais de 15 mil pessoas com o Jeunesse, numa tarde de verão, é algo que até os clubes de dimensão superior invejam.
Ivo Vieira tem sido muito elogiado. É urgente avançar para a renovação de contrato?
Estamos confortáveis com a relação que temos e estamos satisfeitos com o trabalho desenvolvido. Não é altura para balanços. Estamos no início de um percurso. Os indicadores iniciais são positivos, quer pela qualidade de jogo, quer pelos resultados. Repito, estamos confortáveis com a situação atual de Ivo Vieira.
É um treinador fundamental para o projeto?
Fundamental é Miguel Pinto Lisboa, porque é o pai do projeto. É a única pessoa que pode ser considerada imprescindível.
Já houve alguma proposta de renovação para Ivo Vieira?
Não. São questões internas que serão abordadas no timing definido por nós.
Por onde passou, ajudou os clubes a realizarem bons negócios. No V. Guimarães será igual em relação a Tapsoba?
Não especificamente o Tapsoba. Mas é um jogador que tem crescido num coletivo que tem funcionado. Uma das missões é potenciar jogadores e conseguir vendas que signifiquem importantes encaixes para o clube.
Sendo o V. Guimarães um clube vendedor, o plantel poderá perder jogadores em janeiro?
Não está minimamente previsto. Temos que atuar numa missão de sobrevivência. O planeamento financeiro está feito para que esta época decorra dentro da normalidade prevista.
E entradas?
Não somos apologistas de grandes mudanças a meio da época, porque significaria que o trabalho de verão não resultou. O meio-campo foi muito fustigado com lesões de longa duração e esperemos que isso não aconteça em mais nenhum setor.
No passado, o V. Guimarães recebeu vários jogadores do F. C. Porto por empréstimo. É um cenário a ser equacionado?
Dentro da ambição de criar valor desportivo e financeiro, interessa-nos jogadores por empréstimo, desde que haja cláusulas de rescisão que possamos pagar. É a nossa visão para jogadores emprestados.
Os principais clubes queixam-se da calendarização do campeonato, mas o V. Guimarães, o clube com mais jogos disputados em Portugal, ainda não se pronunciou...
É um tema que tem impacto naquilo que é o desempenho dos clubes, mas há questões mais importantes. Era mais urgente debater quadros competitivos e abordar o conceito das equipas bês e sub-23. E debater a abolição total daquilo que são as restrições de jogadores extracomunitários por parte de clubes como os portugueses, que têm manifestamente mais dificuldade em contratar no mercado estrangeiro do que os clubes do top-5. Se perdemos os melhores e não temos capacidade de ir recrutar onde quer que seja, e ainda temos de estar preocupados com quotas de jogadores locais e quotas de mais isto e mais aquilo, obviamente corremos o risco de a qualidade ser cada vez mais diminuta.
Passou duas épocas no Sporting de Braga. Sente-se como um dos responsáveis pelo crescimento do clube?
Não tenho esse ego tão exacerbado, porque muita gente contribuiu para que eu pudesse chegar a quase a 20 anos de carreira. O que nesta função, para mim, é motivo de satisfação.
Sente que o Sporting de Braga está um patamar acima do V. Guimarães?
Não. Sinto que em termos de clube e potencial, o Vitória é maior que o Braga. Não quero entrar em questões de desrespeito, nada disso. Apenas que o Vitória tem potencial inexplorável e que pode fazer dele um caso muito sério no contexto do futebol português.
Esteve dez anos no Sporting. Admite um dia voltar?
Não fiz nenhum roteiro em termos de carreira. Tinha a ambição de trabalhar no estrangeiro e de trabalhar no mercado inglês. Estive perto de o conseguir em três ocasiões. Trabalhar em Itália era uma ambição de criança, porque era o campeonato onde jogavam o Zico, o Maradona, o Careca, entre outros. A minha realidade chama-se Vitória e sinto que tenho condições para crescer e ajudar o clube a crescer.
Pela experiência adquirida, ambiciona um dia ser presidente de um clube?
Tenho a sorte de ter um hobby remunerado, porque faço aquilo de gosto, ou seja, interajo com presidentes, treinadores e jogadores. Hoje em dia, um diretor-geral não é figura central de uma SAD, está no centro da SAD. O desempenho desta função implica estar em contacto permanente com o presidente do Conselho de Administração da SAD, com a Administração, com a parte jurídica, com a parte da comunicação e com a parte financeira.
Trabalhou com Jorge Jesus. O que o diferencia de outros treinadores?
É um viciado puro naquilo que faz. Em termos defensivos, é talvez o treinador mais perfecionista com quem já trabalhei.
CV: Carlos Freitas
Data de nascimento: 22/06/1966 (53 anos)
Naturalidade: Lisboa
Cargo: diretor-geral do V. Guimarães
Clubes por onde passou: Sporting, Braga, Panathinaikos (Grécia); Metz (França) e Fiorentina (Itália)