Diamantino recorda o Portugal-Marrocos (1-3), no Mundial de 1986. Marcou o golo da equipa das quinas.
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É tramado o Mundial 86. Em 270 minutos de bola espalhados pelos três jogos da fase de grupos, tão-só dois golos para o nosso contentamento. É tramado o Mundial 86. Desses 270 minutos, Diamantino joga 202 minutos. É titular vs. Inglaterra, é titular vs. Polónia e entra aos 68 minutos vs. Marrocos.
Nos tais dois golos portugueses, Diamantino deixa a sua marca. A abrir, um nó cego a Samson, com a bola entre as pernas, antes do cruzamento-amortie para o 1-0 de Carlos Manuel. A fechar, um chapéu belíssimo a Zaki. Curiosidade maiúscula: a realização do México 86 apresenta Diamantino, número 17, como M. Fernandez (de Diamantino Manuel Fernandes Miranda) e a cara do central José António, número 16. Começamos por aí.
Li n'a Bola, o Diamantino ficou com o número 10 no primeiro sorteio das camisolas.
Verdade, saiu-me o 10. Mas não o quis, fui atrás do 17 e, voltas e mais voltas, lá o consegui.
Porquê 17?
Foi o meu número no Mundial sub-20 em 1979, no Japão. E, na verdade, nunca fui o 10. Sempre fui o 11, desde os tempos dos juvenis do Vitória.
Espetáculo. E o 10 foi para quem?
Mais uma vez: voltas e mais voltas, foi parar ao Futre.
O Diamantino joga com Inglaterra e Polónia, depois vai para o banco. Porquê?
De Saltillo dizem-se muitas mentiras e poucas verdades. Sobre esse detalhe em particular, nada sei em concreto. E mesmo que me contem uma verdade absoluta, mesmo que contada por um amigo, tenho de descontar um por cento e isso basta para encarar essa verdade absoluta como não tão absoluta. Só acredito naquilo que vejo e sinto. O que se disse sobre essa alteração do jogo com a Polónia para o jogo com Marrocos é que havia dirigentes da federação a pressionar o selecionador José Torres para meter um outro jogador na minha posição. E esse jogador, porventura, até merecia o estatuto de titular. Aliás, saí eu e o André, se não me engano.
Correto e afirmativo. E soube-se quando dessa troca?
Eischhhhh, isso agora. Já não me lembro. Tenho ideia que sabíamos da equipa titular no dia do jogo, mas há sempre coisas que se notam nos treinos de véspera e antevéspera.
E o Diamantino notou?
Notei, ahahaha.
Quando entrou com Marrocos...
Já estava 3-0, acho. Nem sei quem substituí [Sousa].
E lembra-se do golo?
Calma lá, isso sim.
Ahahahah. Grande golo.
Foi, sim senhor. Não sou de qualquer espólio da minha carreira, mas há amigos meus que, de vez em quando, enviam-me jogadas, golos e tal. E esse a Marrocos está lá sempre. Foi um senhor golo, reconheço.
Chapéu de aba curta?
Ahahahah. Rodopiei sobre mim mesmo e meti um chapéu, sim. O guarda-redes deles tinha saído a soco e sabia que só assim ia dar golo. Estava descaído para o lado esquerdo, já dentro da área, e meti com o esquerdo. O direito era bom, o esquerdo não era cego. Ahahahahah.
Ahahahah.
Sabia mexer-me bem na área, porque o Eriksson já tinha apostado em mim como avançado.
Quando?
A aposta em si foi em 1983/84. Na época anterior, há um jogo que nunca me esquecerei. Bem, não é bem o jogo, é mais o comentário do Eriksson no final.
Então?
Foi um jogo da Taça de Portugal em Paços de Ferreira. O Benfica ganhou 5-1, entrei para o lugar do César e fiz dois golos. Ainda hoje me lembro do Eriksson a dizer-me naquele português arranhado: "O Diamantino parecia o Paolo Rossi". E o Paolo Rossi tinha sido o melhor marcador do Mundial 82. Ele que nem era um avançado fixo, 9 puro. Na época seguinte, joguei como segundo avançado. À Rossi, portanto. E acabei em terceiro lugar na Bola de Prata, atrás de Gomes e Nené.
G"anda volta. Do México para o bis em Paços de Ferreira.
Ahahahah. Há mais histórias destas, ó Rui, é só sentar à mesa e desbobinar.
Imagino. Como é que se perde com Marrocos em 1986?
Estive há dias a fazer a revalidação da licença da UEFA e calhou-me estar com o preparador físico dessa seleção de Marrocos. É um tipo porreiro, brasileiro. Chama-se Jorvan Vieira. E ele confirmou-me que Marrocos queria empate e foi mesmo ao hotel de Portugal para combinar o resultado.
E então?
José Torres nada quis com isso do resultado combinado. Eu faria o mesmo. Até porque julgávamo-nos superiores a Marrocos. Eles tinham dois pontos, como nós, mas nós tínhamos ganhado à Inglaterra e perdemos mal aquele jogo com a Polónia. E também porque entre um jogo e outro, a lesão do Bento foi um abalo. Todos o sentiram. Damas incluído. Aliás, o Damas não estava psicologicamente à altura do desafio. Foi um dos grandes guarda-redes portugueses e até do Mundo, até porque arriscou e jogou lá fora, em Espanha, mas, naquele momento do México, ele não estava pronto. Atenção, zero culpa nos golos sofridos com Polónia e Marrocos, mas ficámos debilitados sem o Bento e achávamos que íamos ganhar a Marrocos, quanto mais não fosse com um golo caído do céu nos últimos minutos. E mesmo que não caísse, empatávamos e seguíamos em frente. Quando percebemos a coisa, já estava 2-0 para eles ao intervalo.