Sucesso da edição de estreia faz elevar as expectativas. Há novos candidatos e talentos a despontar
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Há um ano, o futebol português entrava no campo do desconhecido. Não pela criação de um escalão competitivo que fizesse a ponte para o futebol profissional, mas por se esperar dele um nível de exigência superior ao até então visto, tanto para clubes, obrigados a cumprir requisitos mais apertados, como para jogadores, pelo incremento de competitividade esperado.
Pretendia-se que a Liga 3 fosse "uma competição transparente, credível e íntegra", assente num "triângulo entre o clube, a região e a autarquia" e que desse espaço "à progressão dos jovens futebolistas formados em Portugal", antevia José Couceiro, vice-presidente da Federação Portuguesa de Futebol, metas que a edição de estreia validou sem reservas e aumentam as esperanças para a época que arranca este fim de semana.
A qualidade do futebol praticado, que redundou em 844 golos nos 336 jogos disputados, levou muitos adeptos aos estádios, com dois jogos a superarem a barreira dos 10 mil espectadores nas bancadas, o V. Setúbal-U. Leiria (14 089) e o U. Leiria-Oliveirense (13 247).
Muitos talentos emergiram, alguns dos quais a saltarem diretamente para a Liga. Só o Felgueiras lançou Danilo (Gil Vicente) e Théo Fonseca (Famalicão), enquanto Yago Cariello, oriundo da U. Santarém e autor do primeiro "póquer" da história da prova, já se estreou a marcar pelo Portimonense. Paradigmático foi o caso de José Melro, outro avançado da despromovida U. Santarém, que se mudou para os sub-23 do Benfica.
Jovens como Paulo Moreira (Varzim), João Silva (Felgueiras) ou Afonso Valente (U. Leiria) surgem como talentos a seguir com atenção ao longo da época, assim como os consagrados Rui Pedro (Sanjoanense), Zequinha (V. Setúbal), Ricardo Rodrigues (Alverca) ou Gonçalo Gregório (U. Leiria).
Para 2022/23, a lista de candidatos a suceder ao campeão Torreense e à Oliveirense na subida à Liga 2 é extensa. Os despromovidos Varzim e Académica são naturais aspirantes, juntamente com o Alverca, derrotado no play-off de subida frente ao Sp. Covilhã. A estes junta-se a crónica U. Leiria e os históricos Sanjoanense e V. Setúbal, para além de São João de Ver, Amora e as equipas B de Sp. Braga, V. Guimarães e Sporting, recheadas de jovens talentos.
Numa época em que serão despromovidas oito equipas, em vez das quatro da edição anterior, a competitividade promete atingir picos transcendentais. O puro futebol está de volta, resta apreciá-lo num estádio perto de si.
Sanjoanense mantém estilo para crescer
Após estreia positiva, filosofia de futebol ofensivo é para manter, com o objetivo de subir degraus competitivos
Na Liga do "Puro Futebol", nem só de resultados se fazem balanços positivos. Seja pelo futebol praticado ou pelos talentos colocados em patamares competitivos mais aliciantes, há variáveis importantes a ser cumpridas para dar força a um projeto com visão alargada no tempo.
A Sanjoanense sabe-o bem. Na época passada, o apuramento para a fase de subida, na Série A, falhou por dois curtos pontos. No entanto, isso não tirou foco nem alegria à equipa, que venceu a sua série de manutenção e manteve um nível exibicional assinalável, com forte expressão no ataque, tendo apontado um total de 47 golos na edição de estreia da Liga 3.
"Fomos um dos melhores ataques, com uma média próxima dos dois golos por jogo. Gostamos de assumir o jogo, de pressionar alto. É a nossa filosofia", explica o treinador, Tiago Moutinho, que vê na Liga 3 "bons jogadores e treinadores com muita qualidade", importantes para a promoção do "puro futebol, ofensivo, que ajuda ao espetáculo". A qualidade dos relvados e a visibilidade que a competição alcançou são elogiadas pelo técnico, mas há questões a trabalhar e que já foram alvo de reflexão, entre as quais "algum antijogo na parte final dos jogos".
Campeão na Roménia e na Hungria, e com um hat-trick na Champions no currículo, Rui Pedro viu na Liga 3 uma boa via para regressar a Portugal, cinco anos depois, tornando-se rapidamente numa das figuras da prova. "Fiquei surpreendido, pela positiva. Não estava à espera de encontrar uma liga tão competitiva, bem jogada e com bons jogadores", confessa o avançado, de 34 anos, que olha para a prova como "uma montra gigante".
Valorizar talentos
Só na Sanjoanense, Lucão (Farense) e Zé Pedro (Oliveirense) saíram para a Liga 2, e Aldair mudou-se para o Ponferradina, do segundo escalão do futebol espanhol. "O projeto do clube é procurar jogadores jovens, com qualidade, para os potenciar e colocar em patamares superiores", refere Tiago Moutinho, que vê no salto do trio um "sinal de que as coisas foram bem feitas".
No entanto, isso, por si só, não chega para satisfazer a ambição do clube de São João da Madeira para a nova temporada. Depois de uma época "agridoce", assim definida por Rui Pedro por ter sido "tranquila mas sem chegar à fase de subida", é tempo de dar um passo em frente. "Este ano, queremos mais. O objetivo é estar na fase de subida. Depois, veremos o que irá acontecer", diz Tiago Moutinho.>
FLASH
"Ficou provado que este espaço fazia falta ao futebol português"
>Hélder Postiga, Diretor da FPF
O que esperar da segunda edição da Liga 3?ng>
Pretendemos, acima de tudo, consolidar uma competição que apenas tem um ano de existência. Pretendemos reforçar os valores e princípios que a Liga 3 promove, designadamente o fair-play e o desportivismo, assim como as caraterísticas que diferenciaram esta competição na sua primeira época: o equilíbrio, a competitividade, a valorização de jogadores e treinadores, o envolvimento da comunidade e dos adeptos. Queremos, também, que a Liga 3 cresça em termos de assistências e que os clubes se desenvolvam em termos de infraestruturas.
Que balanço faz da edição de estreia da prova?
Muito positivo. Além de se ter assumido como uma prova supercompetitiva e equilibrada, a Liga 3 foi um espaço onde jogadores, treinadores, dirigentes e clubes se sentiram prestigiados e orgulhosos. Foram criadas condições, a todos os níveis, para dar valor à competição e a todos os seus participantes.
O que trouxe de novo a Liga 3 ao futebol português?
Ficou provado que este espaço competitivo fazia falta ao futebol português. Não foi por acaso que o lema "Puro Futebol" serviu de referência e mote para a competição. Além de servir de antecâmara das ligas profissionais, a Liga 3 procurou incutir um espírito diferente ao jogo, à competição e a tudo o que está à sua volta. Os próprios conteúdos de comunicação foram diferenciadores e, atrevo-me a dizê-lo, inspiradores para outros patamares.
Sente clubes e jogadores totalmente identificados com o espírito da Liga 3?
Sem dúvida. E é como diz, e bem, existe um "espírito Liga 3" que a todos contagia e entusiasma. Tanto os clubes, como os jogadores e os treinadores sabem que este é um espaço que os desafia e os valoriza. E sabem, também, que todos queremos que esse processo se desenrole dentro do mais são espírito desportivo.