Kelvin marcou golo do título há 10 anos: "Estamos atrás, faltam poucos jogos, mas não desistam!"
Herói do título 2012/2013 deixa mensagem de crença. Faz hoje 10 anos que marcou ao Benfica.
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Kelvin foi protagonista de um título improvável, em 2012/13, que 10 anos depois ainda está bem vivo na memória de portistas e benfiquistas. Para uns significa ainda hoje uma explosão de alegria, para outros um pesadelo, que preferem esquecer. Uma década depois, basta ir ao Youtube escrever "golo de Kelvin ao Benfica" e nem é preciso acrescentar mais informação para rever vídeos do golo do brasileiro com milhares de visualizações. Jorge Jesus a cair de joelhos no relvado do Dragão, mal a bola saiu cruzada do pé esquerdo do brasileiro para o fundo das redes, o Dragão em "erupção" e um Vítor Pereira a correr em todas as direções, enquanto Helton e Lucho conduzem alguns adeptos de volta à bancada, são as imagens mais marcantes, depois do golo. No dia em que se assinala uma década sobre o golo histórico de Kelvin - hoje no Ryukyu, da Liga 3 do Japão -, o JN foi revisitar essa memória, numa altura que coincide com um momento do campeonato que volta a testar a crença dos adeptos azuis e brancos.
Dez anos depois, que memória guarda do golo ao Benfica, que valeu o título de 2012/13 ao F. C. Porto?
Fico feliz por ainda fazer parte da memória de todos os portistas e de muita gente que gosta de futebol em Portugal e não só, para os meus familiares, que sempre me acompanharam e me viram realizar um sonho de criança. Foi um golo de superação, tanto da nossa equipa, como de um jogador que não era titular, não era uma peça super importante como outros, como James, ou Jackson, jogadores que estavam sempre em foco, a marcar golos e eram importantes. Eu não era tão importante para a equipa e ali pude aparecer para ajudar. Estava preparado e treinava para quando aquele momento chegasse poder corresponder. Foi uma superação, tanto para mim, como para a equipa, naquele campeonato.
Jesus cai de joelhos, a imagem ficou na memória...
Esse momento valorizou ainda mais o golo. Foi um golo que ninguém esperava. O Vítor Pereira saiu correndo pelo campo, foi uma explosão total. Jesus caiu de joelhos porque nem acreditava. O Benfica tinha uma grande equipa e quando marcaram o golo comemoraram, brindando ao título dentro da nossa casa, ainda no primeiro tempo. Foi um choque para eles, mas foi a nossa identidade. Ter sido contra o Benfica só valorizou ainda mais o golo e era o que queria, fazer golos importantes a equipas importantes.
Teve logo a noção do que representava aquele golo?
A ficha não cai logo. Lógico que era o meu sonho, o meu trabalho, que estava ali para fazer golos. Apanhou toda a gente de surpresa, mas só depois de alguns meses é que cai a ficha. Foi o golo, a festa do título e vira uma bola de neve. Só depois caí na realidade e pensei, fiz um golo importante e fomos campeões. Foi bom. Era muito jovem na época, tinha 19 anos. Em criança brinca-se com um golo no último lance e de repente está a acontecer.
Do Japão consegue acompanhar o F. C. Porto?
Não muito, porque no Japão os horários são bem diferentes [são mais oito horas]. Não consigo assistir a um jogo, mas acompanho pela internet os resultados e vejo os melhores momentos.
A três jornadas do fim, o F. C. Porto está a quatro pontos do Benfica. O milagre ainda é possível?
Com certeza. Enquanto tiverem 1% de chance vão acreditar. Já passámos por isso e conseguimos reverter. Vi alguns momentos do jogo contra o Benfica, na Luz, que venceram. Esse é o F. C. Porto. Essa é a identidade do F. C. Porto. Vão sempre atrás do objetivo até ao fim. Com essa identidade, mesmo com poucos jogos, não vão deixar passar, vão lutar até ao final.
O papel dos adeptos é importante numa altura destas?
Eles sempre lutaram pela equipa. Acompanham a equipa por todo o lado. Têm o mesmo sentimento que os jogadores em campo. Lembro-me do meu golo e deles entrarem em campo. Eu queria saltar para o meio deles, mas nem deu tempo, puxaram-me pelo cabelo, queria ter comemorado com eles, abraçar toda a gente, porque são muito vivos e estão sempre com a equipa. Estamos atrás, restam poucos jogos, mas não desistam!
Falando dessa identidade, o F. C. Porto é uma equipa com uma força emocional diferente?
No F. C. Porto é difícil passar por várias derrotas seguidas, ou a equipa não jogar bem. Em Portugal também joguei no Rio Ave e vivi alguns momentos difíceis, perdemos uns cinco ou seis jogos seguidos, mas isso é coisa que não acontece no F. C. Porto. Mesmo no Brasil, nos clubes grandes onde joguei, passámos momentos difíceis e meses em que a equipa não estava bem, mas no F. C. Porto a chave vira muito rápido. Se não fez um bom jogo, no seguinte já tem de voltar com aquela identidade de vencer e lutar até ao final. É diferente. Por isso é que o clube venceu o que venceu nos últimos 10 anos, por essa identidade.
Ainda sente um pouco dessa identidade e dessa cultura de vitória do F. C. Porto?
Sim, passamos a ser competitivos ao extremo, treinamos para ganhar, nem no treino quero perder. Aprendi isso muito jovem. No Palmeiras fui campeão da Copa do Brasil, no São Paulo fomos até à semifinal da Libertadores, consegui concretizar algumas coisas nos outros clubes com essa identidade, que fica para a vida. Faz com que nunca desista e levo essa competitividade até hoje de querer vencer e não desistir.
Que significado tem a passagem pelo F. C. Porto na sua carreira?
Saí do Brasil muito jovem, acertei a minha transferência ainda com 17 anos. Tinha acabado de subir a profissional. Estava num momento de transição da adolescência na minha vida. Aprendi muita coisa, muita coisa boa e outras coisas que não esperava. Vinha com o sonho de me afirmar, fazer golos e ser campeão no F. C. Porto, sair e jogar em outros emblemas da Europa. As coisas não aconteceram assim, mas sempre trabalhei forte e respeitei o trabalho de todos os treinadores. Foi importante na transição da minha vida, buscar outros lugares, virar a chave da minha vida, aprender e depois fazer diferente noutros clubes. Foi maravilhoso o que vivi no F. C. Porto. Claro que queria ter tido mais oportunidades e ter marcado mais golos, mas a vida passa rápido, todos querem jogar e se não jogamos temos de buscar outro lugar. A minha vida é assim. O Kelvin mudou, é hoje um homem formado.
Perfil: Kelvin, avançado, 29 anos
Kelvin só deixou de estar ligado ao F. C. Porto em 2018 depois de cerca de três temporadas com os azuis e brancos, onde arrancou na equipa B, e de um empréstimo ao Rio Ave. A seguir, o brasileiro foi cedido a Palmeiras (2015), São Paulo (2016), Vasco da Gama (2017 e 2018), vestiu as cores do Fluminense e Coritiba (2019), Avaí e Botafogo (2020) e Vila Nova (2021), antes de viajar para o Japão, onde representa o Ryukyu, da Liga 3, desde 2022.