Lançou o livro "Guia para Treinadores de Bancada" para mudar a mentalidade dos adeptos portugueses e já criou mais de dois mil exercícios de treino. Sempre inspirado no futebol holandês.
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Em cada adepto, há um treinador de futebol. A bancada de um estádio é como se fosse um enorme tribunal, onde se discutem tácticas, onde emergem opiniões diversas e onde se idolatram e destroem técnicos a uma velocidade supersónica. A pensar nesse fenómeno, José Ferraz, 59 anos, treinador de futebol no desemprego, lançou o livro "Guia para Treinadores de Bancada", um manual para o simples simpatizante da bola saber ler o jogo e aprender a arte de criar exercícios de treino: "Este livro é uma chamada de atenção para as pessoas perceberem que não é fácil ser treinador de futebol. É preciso uma aprendizagem longa, experiência e prática para desempenhar funções. Em Portugal, temos bons treinadores, mas, infelizmente, não há cursos de formação para dirigentes, que preferem sempre o caminho mais fácil e optam por mandar os treinadores para a rua quando algo corre mal. Os resultados desportivos não se submetem às forças sobrenaturais". A obra tem como objectivo mudar a mentalidade crítica dos adeptos portugueses e foi apresentada ontem, por João Montenegro e Rui Quinta, na Biblioteca Municipal de Barcelos. Hoje, será exibida na Biblioteca Municipal de Espinho, às 21.30 horas.
José Ferraz tem o curso de IV nível de treinador, vive e respira futebol, dá palestras de formação e já publicou 12 livros para desvendar os mistérios e os segredos da modalidade. "Já criei mais de dois mil exercícios de treino. É uma arte que exige muita criatividade, é quase como pintar um quadro", diz, com uma pontinha de orgulho e muita satisfação. "Quantas vezes acordo a meio da noite e vou para a sala desenhar um exercício só para não o perder. É muito desgastante". São as transições, a finalização, o processo defensivo, um manancial de conceitos e de tácticas ao serviço do futebol.
Tudo começou na Holanda, onde esteve emigrado durante 18 anos e fundou uma empresa de limpeza, ao mesmo tempo que jogava futebol em clubes secundários. Aos 38 anos, começou a treinar e bebeu a arte futebolística do país das tulipas, fez cursos de formação ao lado de nomes consagrados como Ruud Gullit, Frank Rijkaard e Johan Neeskens e conviveu com o mestre Rinus Michels, o criador do chamado futebol total, onde todos atacam e todos defendem, e autor do famoso pressing. "Os holandeses sabem ensinar futebol, são muito cerebrais e criativos e dão importância à disciplina e ao rigor táctico".
Há 11 anos, José Ferraz regressou a Portugal e começou a escrever livros sobre futebol para explicar os segredos da modalidade. Treinou o Leça e o Vianense, nos escalões secundários, e também esteve emigrado no futebol africano, onde orientou a selecção de São Tomé e Príncipe e o Progresso de Sambizanga, clube angolano que deu a conhecer Pedro Mantorras. Há cerca de três anos, vive as amarguras de um desempregado: "Sinto uma enorme injustiça por não ter qualquer projecto em mãos, porque sou prelector em cursos de formação. Muitos treinadores da Liga foram meus alunos, mas em Portugal a competência não tem qualquer significado. Por isso, passo o tempo em casa a escrever os meus livros". Algumas obras já são manuais didácticos em cursos de formação para treinadores de futebol, outras até se destinam aos adeptos como o "Guia para Treinadores de Bancada".