Há sete técnicos lusos em clubes brasileiros, um número nunca visto. Superada a desconfiança, sobra a exigência.
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Mais do que uma tendência, é uma realidade. Os principais clubes do Brasil estão a apostar como nunca em treinadores portugueses, que são sete na época em vias de começar, um número recorde, todos ao leme de equipas que vão disputar o "Brasileirão".
Nos 20 clubes da Série A, há 10 treinadores brasileiros, dois argentinos e um uruguaio. O resto vem de Portugal: Abel Ferreira continua no campeão Palmeiras, Vítor Pereira trocou o Corinthians pelo Flamengo, Luís Castro mantém-se no Botafogo, António Oliveira saiu do Cuiabá para o Coritiba, Pedro Caixinha deixou o Talleres (Argentina) para rumar ao Red Bull Bragantino, Renato Paiva foi contratado pelo Bahia e Ivo Vieira pelo Cuiabá.
Como se explica o fenómeno? "Os treinadores brasileiros não procuraram evolução e ficaram para trás ao nível da metodologia de treino e do conhecimento tático. A CBF só tardiamente exigiu cursos de treinadores. Os portugueses têm grande capacidade de adaptação, falam a mesma língua, estão mais preparados para a gestão de recursos humanos, que no Brasil é muito importante, e para a forma de lidar com a imprensa. Por isso, tornam-se apelativos", diz, ao JN, Pedro Correia, um português que trabalhou sete anos no Grémio Anápolis e é o atual "head scout" do Cruzeiro.
A ideia de que o êxito de Jesus no Flamengo, em 2019, com seguimento no êxito de Abel no Palmeiras, abriu portas a outros treinadores lusos acompanha a noção de que a desconfiança com que os portugueses eram encarados foi ultrapassada. "Este é o início da era das SAD no Brasil. Contratar um treinador tornou-se um investimento mais criterioso, que tem de ter retorno. Os portugueses são profissionais confiáveis", refere Pedro Correia, acrescentando: "A desconfiança deu lugar à exigência".
No Brasileirão de 2023, que Pedro Correia considera "o mais difícil dos últimos anos", talvez Abel seja o português com "maior margem de manobra", devido ao sucesso no Palmeiras: "Vítor Pereira terá o maior desafio da carreira. Luís Castro será pressionado a lutar pela Libertadores. Paiva e Caixinha estão em contextos de investimento. Não será fácil para Ivo Vieira no Cuiabá, nem para António Oliveira no Coritiba, mesmo que estes sejam os dois únicos clubes da atual Série A sem muita história".
Técnicos lusos escaparam aos despedimentos
Falar em treinadores no Brasil continua a ser sinónimo de muitos despedimentos ao longo de uma temporada. Os números dizem que houve 23 trocas de técnicos em clubes do "Brasileirão" em 2022, sendo que duas das saídas aconteceram logo após a primeira jornada. Dos 20 clubes que competiram na prova, só Palmeiras, Corinthians, Botafogo, Fortaleza e São Paulo não mudaram de comando ao longo do campeonato brasileiro, sendo que os três primeiros foram treinados por portugueses: Abel Ferreira, Vítor Pereira e Luís Castro. Abel Ferreira é, de resto, o técnico que está há mais tempo à frente de um clube brasileiro, desde outubro de 2020.
Campeonato só começa em abril
A época de 2023 do futebol brasileiro começa a 15 de janeiro, com a disputa dos campeonatos estaduais, que acabam a 9 de abril. O "Brasileirão" inicia-se a 15 de abril e termina a 3 de dezembro. A Copa do Brasil começa a 22 de fevereiro. A Supercopa, primeiro título da temporada, entre Palmeiras e Flamengo, joga-se no dia 28 de janeiro.
Libertadores pode ter oito do Brasil
A fase de grupos da Libertadores tem garantidos seis clubes brasileiros, entre os quais o Flamengo, atual campeão, e o Palmeiras, mas podem ser oito. A prova começa em março.
Armada lusa no "Brasileirão"
Bicampeão português pelo F. C. Porto, em 2012 e 2013, Vítor Pereira aventurou-se no Brasil este ano, após passagens pelo futebol alemão, turco, grego, chinês e egípcio. Respondeu com bons resultados ao desafio do Corinthians, mas problemas familiares pareciam obrigá-lo a voltar a Portugal. Até que surgiu o Flamengo...
Após uma passagem marcante pela formação do F. C. Porto, teve bons desempenhos no Rio Ave, Chaves e V. Guimarães, mas foi na Ucrânia que ganhou um título, ao serviço do Shakhtar. Esteve no Catar e em março deste ano chegou ao Botafogo. Fez uma boa época no ano em que o clube carioca voltou ao primeiro escalão.
Filho de Toni, o popular ex-treinador do Benfica, fez uma carreira discreta enquanto jogador, e iniciou a de treinador no Brasil, como adjunto no Atlético Paranaense. Esteve no Benfica B, mas em junho deste ano rumou ao Cuiabá, conseguindo o objetivo de manter o clube no Brasileirão. Assinou há poucos dias pelo Coritiba.
Jogou dez anos no Nacional, antes de ser adjunto e treinador principal do clube madeirense, com passagens a seguir por Marítimo, Aves, Académica, Estoril, Moreirense, V. Guimarães, Famalicão e Gil Vicente. Já treinou na Arábia e agora chega ao Brasil, para suceder a António Oliveira no comando técnico do Cuiabá.
O ex-adjunto de Peseiro passou a treinador principal há mais de uma década e brilhou no México, com títulos no Santos Laguna e Cruz Azul. Esteve no Catar, Escócia e Arábia, antes de chegar este ano à Argentina, onde fez história ao levar o Talleres pela primeira vez aos "quartos" da Libertadores. Segue-se o futebol brasileiro.
Com trabalho sólido na formação e na equipa B do Benfica, ao longo de 18 anos, partiu em 2021 para a América do Sul. Treinou o Independiente del Valle, no Equador, e depois o León, no México. Agora, tem a oportunidade de se estrear no Brasil, ao serviço do Bahia, que subiu à Série A e pertence ao projeto "City Group".
Outros portugueses com passado em clubes brasileiros
Paulo Sousa, Flamengo, 2022
Jorge Jesus, Flamengo, 2019 e 2020
Jesualdo Ferreira, Santos, 2020
Sá Pinto, Vasco da Gama, 2020
Augusto Inácio, Avaí, 2020
Paulo Bento, Cruzeiro, 2016
Sérgio Vieira, Atl. Paranaense e América, 2015 e 2016