Pacheco faz só um ano no Portimonense antes de aterrar na Luz, onde é campeão e joga uma final europeia na época de estreia.
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Nascido e criado em Portimão desde 1966, ano do primeiro Portimonense-Benfica, Pacheco transfere-se de um clube para o outro em 1986 e, veja-se lá a coincidência, estreia-se pelo Benfica na cidade-natal. Motivos de sobra para uma entrevista telefónica de Lisboa até Lagos, onde Pacheco é dono do Amuras Bar desde os tempos do Sporting.
Bom dia Pacheco, tudo bem?
Então Rui, o que é feito?
Tudo em forma. Ligo-lhe para falar do Portimonense-Benfica.
Bora, vamos a isso.
O Pacheco sabia que o primeiro Portimonense-Benfica é em 1966, ano do seu nascimento?
Olha, não sabia. Grande coincidência. E tu sabias que o meu primeiro jogo pelo Benfica foi em Portimão?
Olha, não sabia. Grande coincidência. Foi a primeira jornada?
A terceira. Na primeira, fomos à Covilhã e eu banco. Na segunda, com o Vitória FC, no Jamor, campo neutro por castigo federativo à Luz pela festa do título de campeão no ano anterior, nem sequer fui convocado. Na terceira, joguei a titular. Por coincidência, em Portimão.
E sentiu-se bem em casa?
Sempre. Estava lá a minha família toda. Só não estava o meu cão, porque não tenho cão.
Nasceu em Portimão. E ia à bola ver o Portimonense?
Então não ia?! Sempre, todos os jogos, fossem os da 2.ª ou 1.ª divisão.
Memórias, assim de repente?
A subida à 1.ª divisão em 1976, o quinto lugar em 1985 e a estreia na UEFA. Estava lá no estádio e vi o golo do Pita ao Partizan Belgrado.
Ia com quem ao estádio?
Sempre com o meu avô.
E quem eram os seus ídolos?
À cabeça, um avançado chamado Hilton. Que jogador. Depois, Jailson, Sapinho e Tião. Mais à frente, Norton de Matos e até Vítor Oliveira. Foi ele quem me lançou no Portimonense.
Quando?
Em 1986, ainda tinha 19 anos. Vinha do Torralta, da 2.ª divisão, e, de repente, estava na 1.ª. E o Vítor apostou em mim. No ano seguinte, em 1987, já estava no Benfica. No outro, em 1988, estava a jogar uma final da Taça dos Campeões.
Uiii, e que tal?
De sonho. Nunca me tinha passado pela cabeça. Mas também te digo: meti na cabeça que ia sempre a subir. Aos 21 anos, joguei a primeira final europeia. Aos 23, a segunda.
PSV e Milan, quem apanhou pela frente?
Gerets e Tassotti. Só esses dois.
Dureza, não?
Todos duros, leais e brutais, jogadores brutais. Ainda havia uma diferença física entre os portugueses e os outros. Notava-se bem. O Gerets mais matreiro, fruto da idade. O Tassotti mais confiante, fruto de uma equipa de eleição. Para mim, esse Milan do Sacchi é a melhor equipa de sempre.
E como se preparavam os jogos?
Olha, ainda bem que me fazes essa pergunta. Houve um trabalho de fundo feito por um senhor chamado Jorge Castelo, através de VHS.
Eischhh, as famosas cassetes.
O Jorge ia ver o PSV a jogar lá fora, no campeonato holandês, e levava câmara de filmar. Depois, revia o jogo umas dezenas de vezes e editava as jogadas para filtrar a informação. Estamos a falar de um tempo pré-histórico nesse tipo de inovações. Lembro-me de ir para uma sala e ver como saía o PSV para o ataque e para o contra-ataque, como fazia o PSV um lançamento lateral no meio-campo ou no meio-campo do adversário. Aspetos agora banais, até porque temos tudo à mão de semear, mas muito à frente no final dos anos 80.
E o Pacheco vai parar ao Benfica, porquê?
Houve uma proposta.
Só uma, a do Benfica?
Havia mais clubes metidos ao barulho, e até pagavam melhor.
Qual, por exemplo?
Boavista. Na terceira jornada da 1.ª divisão 1986/87, o Portimonense vai ao Bessa e ganha 3-2. O Forbs marca três golos, todos assistidos por mim. A partir daí, o João Alves e o Valentim Loureiro manifestaram interesse. Quando apareceu o Benfica, alto lá e pára o baile.
E porquê o Benfica?
O Portimonense fez dois jogos seguidos na Luz, um para a 1.ª divisão e outro para a Taça. No primeiro, empatámos 1-1 e o nosso golo é do Luciano, um avançado possante, na sequência de um livre batido por mim e repelido pelo Silvino. Na segunda parte, o 1-1 é de livre direto. O Sérgio, guarda-redes encostado a um poste a orientar a barreira, e o Diamantino mete no poste contrário. O árbitro aponta para o meio-campo e siga. Daí a uns dias, voltámos à Luz e outro jogo renhido. Descambou para o 4-0 só no fim. Devo ter feito bonito e jogado bem.
Quem o marcou nesses jogos?
Fiz gato-sapato do Veloso. E assinei com o Benfica uma semana depois.
Quem falou consigo?
Peres Bandeira.
E como foi a assinatura?
Uiiii, nem te conto. Ainda não havia telemóveis. Tivemos de marcar um encontro secreto ali num bar da praia. O acordo foi fácil, o meu sonho era chegar a um grande.
E a ida para Lisboa?
Fui de comboio, com duas malas e duas mochilas. Um amigo meu do Barreiro apanhou-me em Santa Apolónia.
E a chegada à Luz?
Fui de táxi, no dia da apresentação. "É ali para o Estádio da Luz, se faz favor". Foi mesmo assim, ò Rui.
E os primeiros tempos?
Difíceis. A malta graúda não queria saber dos mais novos, ahahah.
Quem puxou mais por si?
O Dito, central. Era solteiro, como eu.
E depois?
Fiz o meu caminho. O treinador era o Ebbe Skovdahl e metia-me de vez em quando. Quando o Toni o substitui em dezembro, entrei na equipa e nunca mais saí.