Ana Catarina Nogueira conseguiu, aos 40 anos, a maior façanha nacional.
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É comum para um atleta que chega aos 30 anos assistir ao vaticínio do fim da carreira. É assim na maioria das modalidades, mas, como em tudo, não há regra sem exceção. Ana Catarina Nogueira, considerada a maior referência do padel português, é uma delas.
Só aos 32 anos é que a portuense entrou na modalidade. Para trás deixou uma carreira de mais de uma década ligada ao ténis, na qual inscreveu o nome na história ao sagrar-se campeã nacional três vezes. O "desgaste físico e mental", assim como o surgimento de algumas lesões, levaram-na a deixar o ténis.
Habituada a fazer desporto desde sempre, pois antes de ser tenista experimentou o basquetebol e o ténis de mesa, Nogui (assim é conhecida no universo desportivo) ainda se aventurou pelo vólei de praia. Mas quis o destino que o estrelato voltasse novamente com uma raqueta na mão. Aos 40 anos!
Após as primeiras incursões no padel, por insistência do ex-selecionador de ténis Pedro Cordeiro, "nuns campos em que as paredes eram de muro e não vidros como agora", Nogui decidiu dedicar-se a tempo inteiro à modalidade: "As pessoas foram dizendo que tinha jeito. Comecei a ganhar alguns torneios e houve uma altura em que decidi dedicar-me apenas ao padel". Deixou o cargo de selecionadora de sub-18 de ténis e tirou uma licença sem vencimento do INATEL, onde dava aulas de Educação Física. "Fui das primeiras pessoas em Portugal a treinar padel, a ter preparação física para a modalidade, a participar em torneios lá fora e a primeira a jogar a tempo inteiro no Circuito Mundial", revela.
Resultado? Em Portugal, Nogui é a número um do ranking e já se sagrou campeã nacional oito vezes. Mas 2018 foi um ano dourado para ela, cimentando o estatuto de jogadora portuguesa mais bem sucedida. Após ajudar Portugal a ficar em terceiro lugar no Mundial feminino, ofereceu ao país o primeiro título no Circuito Mundial, ao vencer, juntamente com a argentina Delfina Brea, o Challenger Arroyo de la Encomienda, em Espanha. "Era um sonho que tinha. Foi histórico para o padel português porque ninguém tinha chegado perto disso. Foi o culminar de um ano em que me senti a jogar na minha melhor forma", diz a melhor atleta portuguesa e também professora da modalidade. "É uma vitória que pode significar muito, como referência para os mais novos e para o padel em Portugal continuar a evoluir. A evolução tem sido muito grande, mas há muita gente que não conhece a modalidade e este resultado pode ajudar", conclui.
Antigos futebolistas contagiados pela febre
Ana Catarina Nogueira classifica o padel como "um desporto viciante" e garante que "não há nenhum que tenha uma taxa de fidelização tão grande, o que acontece porque o nível inicial é fácil para qualquer pessoa e isso motiva quem experimenta". O número de praticantes aumenta de ano para ano - estima-se que atualmente seja superior a 100 mil - e são cada vez mais os clubes e campos à disposição.
Curioso é que são muitos os atletas de outros desportos que se têm rendido ao padel. Fábio Faria e Hélder Postiga são dois exemplos. Conhecidos pelas carreiras que fizeram no futebol, hoje é no padel que procuram brilhar e ambos começaram a jogar em Espanha: Fábio Faria quando representou o Valladolid, por empréstimo do Benfica, e Hélder Postiga quando atuou no Saragoça.
Outrora adversários nos relvados, agora medem forças nos campos de padel. "Estamos habituados a competir e mantemos o bichinho de jogar uns contra os outros, depois de termos sido adversários no futebol. Costumo jogar com o Hélder Postiga, Fábio Coentrão, Pedro Mendes, Fernando Meira e Nuno Assis", revelou Fábio Faria, que joga "quase todos os dias" na Póvoa de Varzim e que já venceu alguns torneios. "O padel ajudou-me a ultrapassar o problema cardíaco que me obrigou a deixar o futebol. E já pude jogar com o meu pai [Chico Faria], o que no futebol não foi possível", disse.
Já Hélder Postiga ainda não ganhou torneios, mas destaca a parte social. "É claro que ninguém gosta de perder, mas o padel serve para estar com os amigos e divertir-me. Mas quando se ganha, a hora e meia de jogo sabe melhor. Nesta altura, só jogo futebol com os amigos e isso acontece cada vez menos, pelo que o padel é o desporto que me mantém ativo e ajuda a aliviar o stress", revelou o antigo internacional português.
Por fim, uma característica que também joga a favor da febre do padel. "Dá para jogar pares mistos e não se perde competitividade. Não é fácil encontrar um desporto com essa característica", sublinhou Fábio Faria.
Factos e Números:
21.º Ranking wPT
Nogui é a melhor portuguesa no ranking mundial. Objetivo para 2019 é entrar no top 16 e poder participar no Masters.
Orçamento anual ronda 30 mil euros
É o valor gasto em média por um jogador de padel a tempo inteiro. Cabe-lhe procurar e reunir os apoios financeiros para competir durante o ano.
Desigualdade nos prémios
Ao vencer em Espanha, o "prize-money" de Nogui "não chegou a 500 euros". O costume é o prémio nos torneios masculinos ser superior.
DADOS
Mais de 90 mil jogadores federados
Segundo dados da Federação Portuguesa de Padel, no país há atualmente filiados 90 400 jogadores, 6311 juízes-árbitros e 127 clubes.
Arranque há 30 anos
Apesar do "boom" registado na última década, o padel instalou-se em Portugal no final dos anos 90, com a construção de dois campos em Vila Real de Santo António e três na Quinta da Marinha.