Pinto da Costa sofreu no sábado uma histórica derrota nas eleições do FC Porto, culminando 15 mandatos e 15.344 dias seguidos como presidente dos vice-campeões nacionais de futebol, cujo estatuto redimensionou com sucessos e polémicas.
Corpo do artigo
Empossado em 23 de abril de 1982, seis dias depois de ter sido designado sem oposição como sucessor de Américo de Sá, Pinto da Costa atuou nas últimas décadas como o mentor de uma nova correlação de forças no desporto nacional.
Os "andrades" deram lugar à figura mitológica do dragão e Pinto da Costa enriqueceu um legado de 42 anos com 2585 troféus em 21 modalidades, 68 dos quais conquistados no futebol, em que atingiu o estatuto de dirigente com mais títulos e longevidade do mundo da bola.
O principal perseguidor é Florentino Pérez, de 77 anos, que junta 60 cetros seniores - 33 no futebol e 27 no basquetebol - em dois períodos (de 2000 a 2006 e desde 2009) com o Real Madrid.
Nascido a 28 de dezembro de 1937, na freguesia portuense de Cedofeita, Jorge Nuno de Lima Pinto da Costa descendeu de uma família da alta burguesia e com fortes tradições culturais, em que o futebol não tinha grande eco, mas ficou rendido ao principal clube da cidade, servindo-o desde 1962 como diretor do hóquei em patins e em campo e do boxe.
Desafiado pelo então presidente Afonso Pinto de Magalhães para chefiar as modalidades amadoras, de 1969 a 1971, voltou ao F. C. Porto cinco anos depois, já na "era" Américo de Sá, para liderar o departamento de futebol e apostar no regresso de José Maria Pedroto ao clube.
Essa segunda passagem como treinador do ex-médio "azul e branco" eternizou-se com a obtenção do bicampeonato nacional, em 1977/78 e 1978/79, após um "jejum" de 19 anos, mas findaria no "verão quente' de 1980, quando acompanhou a saída de Pinto da Costa.
Domínio na Liga e nos títulos internacionais
As bases edificadas com Pedroto seriam resgatadas dois anos depois, tendo o dirigente chegado ao poder aos 44 anos, numa altura em que o F. C. Porto só totalizava 16 troféus, incluindo sete edições da I Liga, "explodindo" a partir da reviravolta vitoriosa no terreno do Benfica (2-1) para a Supertaça Cândido de Oliveira de 1983, após 0-0 no primeiro duelo.
A doença prolongada do "mestre" havia deixado o então treinador-adjunto António Morais no banco nesse jogo, tal como aconteceu na final da Taça das Taças de 1983/84, perdida diante dos italianos da Juventus (1-2), num sinal da emancipação internacional do clube.
Seguiram-se sete sucessos internacionais, mais do dobro dos três alcançados por Benfica e Sporting, incluindo Taça dos Campeões Europeus (1987/88), Taça Intercontinental (1987 e 2004), Supertaça Europeia (1987), Taça UEFA (2002/03), Liga dos Campeões (2003/04) e Liga Europa (2010/11), numa afirmação apoiada também pela crescente consistência interna.
O F. C. Porto dominou 23 das 42 edições da I Liga finalizadas na "era" Pinto da Costa - por entre um "penta", feito singular em 90 edições da prova, de 1994/95 a 1998/99 -, deixando 19 cetros divididos por "águias" (14), "leões" (quatro) e o rival portuense Boavista (um).
Ao agregarem 15 Taças de Portugal, 22 Supertaças Cândido de Oliveira e uma Taça da Liga, os 'dragões' mais do que quintuplicaram o seu palmarés e arrebataram 68 dos 145 troféus futebolísticos em disputa em Portugal desde o arranque do 'reinado' presidencial.
Entre as principais modalidades de pavilhão, o andebol (de 13 para 44 êxitos no patamar sénior), o basquetebol (de seis para 46), o hóquei em patins (de um para 77, incluindo 10 internacionais) e o voleibol (de 11 para 23) também foram evoluindo em competitividade.
A modernização encetada por Pinto da Costa refletiu-se ainda no património, desde logo com o rebaixamento do Estádio das Antas (1986), cuja demolição viria a coincidir com a abertura do Dragão (2003), intercalada com o Centro de Treinos e Formação Desportiva PortoGaia, no Olival (2002), o pavilhão Dragão Arena (2009) e o museu do clube (2013).
Polémicas em palavras e em livro
Além da frequência em combinar êxitos desportivos com polémica fora das quatro linhas, pôs os "dragões" a falarem ao ritmo da sua própria voz, aglutinadora do portismo e plena de discurso frontal, inflamado e irónico contra o "centralismo de Lisboa" por si censurado.
Estratega na gestão do palco mediático e desigual na relação com os oito homólogos do Benfica e os 12 do Sporting conhecidos desde 1982, semeou ódios e amores, comprou e vendeu guerras, sem ter passado despercebido nessa irrupção institucional do F. C. Porto.
Ligado a vários processos criminais, mas sem condenações nos tribunais comuns, viu a sua reputação beliscada em 2004 com o envolvimento no Apito Dourado, que investigou alegados casos de corrupção no futebol português, tráfico de influências e coação sobre árbitros, estando inviabilizado o uso de escutas comprometedoras como meio de prova.
O controverso "Eu, Carolina", lançado pela ex-companheira Carolina Salgado, foi um dos livros resultantes da vida e obra de Pinto da Costa, quinto presidente da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP), de 1995 a 1996, e fundador da FC Porto SAD, em 1997.
Acostumado a ser unânime no universo "azul e branco", o dirigente deixou-se arrastar no poder e pagou pelo momento mais delicado do seu "reinado", sem ter conseguido suster André Villas-Boas, antigo treinador do clube, no ato eleitoral mais concorrido de sempre.