Prémio Puskas: uma bicicleta em muletas que prova que não há impossíveis no futebol
Na juventude, Marcin Oleksy quis ser como Iker Casillas, mas um acidente enquanto trabalhava tirou-lhe uma perna e mudou-lhe os horizontes. Não se rendeu perante a adversidade, voltou aos relvados para jogar futebol para atletas amputados e assinou um dos golos mais icónicos da história do jogo. O prémio Puskas recebido na gala "The Best" da FIFA ajudou a dar visibilidade a uma história de uma impressionante perseverança.
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Ver Marcin Oleksy voar para um pontapé de bicicleta numa partida de futebol para amputados é como encarar a vida sob um novo prisma. É olhar o mundo sem barreiras, sem sonhos desfeitos nem impossíveis por que lamentar. É ver a vida como ela é, um fôlego de oportunidade que guia os mais determinados a momentos icónicos.
Quando o nome do jogador polaco, de 35 anos, foi anunciado como autor do melhor golo do ano nos prémios "The Best", da FIFA, o futebol não prestava homenagem apenas a um remate por poucos sequer imaginado. Dava, antes, um sinal de que todos podem ser heróis, mesmo quando as probabilidades teimam a jogar contra si.
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Foi isso que aconteceu com Oleksy. Na juventude, sonhava ser guarda-redes e seguir as pisadas do ídolo Iker Casillas, internacional espanhol que marcou uma era no Real Madrid e que terminou a carreira no F. C. Porto.
Só que a vida obrigou-o a encontrar um emprego na construção civil, que conciliava com a carreira no futebol até ao fatídico dia 20 de novembro de 2010, quando um carro desgovernado se despistou contra umas máquinas pesadas que desabaram em cima da sua perna esquerda.
Num breve instante, o quotidiano de Marcin Oleksy ficava virado do avesso. Chegou inconsciente ao hospital e só quando acordou, após ser operado, percebeu que tinha perdido uma das pernas.
Aos 23 anos, via-se forçado a lidar com uma situação traumática e permanente, mas encarou-a com uma certa naturalidade. "A minha família veio ver-me (ao hospital). Estava toda a gente triste e a chorar, e eu só queria fazer brincadeiras para deixar a situação mais leve. Começaram todos a rir. Isso ajudou e deixou-nos mais animados", contou o jogador ao sítio da FIFA.
Aquando do acidente, a sua esposa estava grávida, mas nunca se negou a esforços para apoiar o companheiro. "Sou muito grato pelo que ela fez por mim. Graças a ela, voltei a ser eu mesmo", confessou o polaco.
Dois anos depois do acidente, Oleksy deixou a cadeira de rodas e voltou a andar, apoiado por duas muletas, as mesmas que utiliza nos jogos de futebol para amputados, modalidade que descobriu em 2019 e na qual tem mostrado todo o seu talento, não como guarda-redes, mas no papel de goleador.
Treina três vezes por semana no Warta Poznan e já chegou à seleção nacional polaca, mesmo tendo de se levantar todos os dias às 5 horas da madrugada para ir para o trabalho.
"Depois do acidente, a minha vida poderia ter tomado um rumo totalmente diferente. Poderia ter dado tudo errado, mas fiquei mais forte. Sei que posso lidar com qualquer problema. Pode parecer algo estúpido, mas estou feliz sem minha perna. Estou feliz com minha vida", confessou Oleksy.
Após receber o prémio Puskas referente ao ano 2022, o polaco agradeceu a todos aqueles que o ajudaram a "passar por cima das dificuldades depois do acidente". "Agradeço à família do futebol. É graças a vocês que conseguimos ir tão longe", acrescentou, no púlpito da gala "The Best".
Um prémio que revela craques desconhecidos
Criado em 2009, o prémio Puskas elege o melhor golo de cada ano, numa eleição feita à escala global.
Cristiano Ronaldo venceu a primeira eleição com um golo pelo Manchester United apontado no Estádio do Dragão, frente ao F. C. Porto, numa eliminatória da Liga dos Campeões.
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De lá para cá, outros craques foram distinguidos, casos de Neymar (2011), Zlatan Ibrahimovic (2013), James Rodríguez (2014) ou Mo Salah (2018), mas também figuras até então pouco conhecidas no mundo do futebol.
Um dos casos mais paradigmáticos foi o do brasileiro Wendell Lira, do Goianésia, que venceu a eleição de 2015 com um golo acrobático apontado no campeonato estadual goiano. A distinção abriu-lhe caminho a uma carreira nos...Esports.
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E de Mohd Faiz Subri, já ouviu falar? Foi o vencedor do prémio Puskas com a votação mais elevada de sempre (59,5%) com um golo de livre direto marcado ao serviço do Penang, na Liga da Malásia.
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Há ainda a história do húngaro Dániel Zsóri, distinguido em 2019 por um pontapé de bicicleta impressionante no jogo entre o Debreceni, onde jogava, e o Ferencváros, a contar para o principal campeonato da Hungria.
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Em 2023, foi a vez de Marcin Oleksy emergir do anonimato e deixar o mundo rendido a uma história que a todos tocará. Na eleição final, superou a concorrência do brasileiro Richarlison e do francês Dmitri Payet, mas nem eles terão duvidado da justeza da distinção.
"Sinto que não fui só eu quem marcou o golo, mas toda a família do futebol para amputados", disse Oleksy quando foi nomeado para o prémio Puskas. Uma história que servirá, certamente, de inspiração para tantas outras ainda por escrever.