K1CK, campeões nacionais, e FCPorto Soccersoul, vencedor da última edição da Taça de Portugal, discutem, esta sexta-feira, a Supertaça de futebol virtual em pleno Estádio do Dragão.
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Pode uma Supertaça ser disputada sentindo-se o cheiro da relva, ainda que longe dela, e vivenciando o ambiente das bancadas mesmo que jogada na tribuna VIP? Pode, se falarmos de futebol virtual, e o Estádio do Dragão vai entendê-lo esta sexta-feira, quando receber o jogo entre os K1CK, campeões nacionais em título, e o FCPorto Soccersoul, detentor da Taça de Portugal de futebol virtual. O duelo, marcado para as 20.30 horas, definirá o vencedor do primeiro troféu do ano e terá transmissão no canal da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) na plataforma Twitch.
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A escolha do palco da final respeitou algumas premissas logísticas, como o facto de as duas equipas estarem sediadas no norte do país, e seguiu a matriz da FPF eFootball de "criar mais experiências entre ambos os mundos", o real e o virtual, razão pela qual a Supertaça já foi disputada, no passado, "em espaços muito diferentes, como o Estádio do Algarve, a Altice Arena ou a Cidade do Futebol", explica o coordenador, Raul Faria.
"Será um duelo interessante entre dois clubes tão diferentes. O F. C. Porto já está no desporto há muito tempo, é um clube tradicional, e os K1CK são uma organização de "esports" muito antiga, que vem do "gaming" para o universo do futebol", nota o responsável, que vê nesta singularidade uma oportunidade para "fazer coisas diferentes e criar ligação entre clubes com origens diferentes".
As próprias equipas estão animadas com a envolvência em torno do encontro. O treinador do eFCPorto Soccersoul, José Carlos, ou "ICEMENJC10" como é conhecido no mundo virtual, fala num "momento muito especial", também por a Supertaça se disputar "em casa", no Estádio do Dragão, algo que, admite, "tem um peso acrescido".
"As pessoas do clube estão muito entusiasmados porque têm apostado na modalidade e crescido. Os torneios tendem a ser, sobretudo, na zona de Lisboa. Para as equipas do norte, isso é sempre mais complicado, por causa das deslocações. O facto de o jogo ser no norte já é uma vantagem", acrescenta o técnico, de 29 anos.
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Também Diogo Brás, jogador dos K1CK que muitos conhecerão por "somosnos" no universo do futebol virtual, mostra-se "entusiasmado e curioso para ver o que vai ser" uma Supertaça disputada no Estádio do Dragão, palco que "vai dar um ambiente diferente à final".
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Preparação como no futebol real
Por estas horas, ultimam-se as estratégias para a grande final. Tal como no futebol dos comuns mortais, nada é deixado ao acaso na preparação de uma partida de futebol virtual.
Antes de mais, convém explicar o formato da prova. A Supertaça é disputada à melhor de cinco jogos, com a equipa que chegar primeiro aos três triunfos a erguer o troféu.
Cada equipa é comandada por dois utilizadores e usa a sua "Ultimate Team" no FIFA 23. Ela pode conter até uma lenda (jogadores já retirados) e até três jogadores com um nível de 90 ou superior, sendo que os restantes jogadores só podem ter um nível de 89 ou inferior. Estas restrições não se aplicam aos guarda-redes.
Isso faz com que "as equipas tendam a ser muito idênticas", podendo mudar "um ou outro jogador por uma questão de preferência", confessa o treinador do eFCPorto Soccersoul, José Carlos, o que torna o trabalho de preparação para a partida ainda mais exigente.
"Fazemos uma análise do adversário. Vemos como ele ataca e defende, quais as lacunas defensivas, e treinamos as bolas paradas", explica o técnico dos portistas, que cumpre a segunda temporada no cargo e conquistou a Taça da Liga e a Taça de Portugal, na época passada.
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"Já disputei quatro finais como treinador e ganhei-as todas", vinca, ele que tem uma filosofia muito própria quando está em jogo a conquista de troféus: "Tento entrar sempre de uma maneira mais pressionante para criar alguma instabilidade no adversário que nos possa dar uma certa vantagem emocional".
Nos K1CK, campeões nacionais na última temporada, o cenário não é muito diferente. "Tentamos estudar o adversário, ver jogos que tenha feito nesta edição do jogo e trabalhar táticas a utilizar", explica Diogo Brás, que aponta as bolas paradas como "um momento crucial nesta edição do FIFA". "Num jogo muito equilibrado, conseguimos tirar algo dali", assinala.
Em certos momentos do ano, a equipa realiza até estágios. "Nem sempre é possível fazer, mas é importante. Torna mais fácil a comunicação entre todos", refere Diogo.
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Um universo em franca expansão
Aqueles que estranham a forma cada vez mais profissionalizada com que os desportos virtuais, vulgo "esports", são encarados, talvez desconheçam a dimensão de um fenómeno cada vez mais globalizado.
Em março do ano passado, a "Newzoo", analista de dados relacionados com o mundo "gaming", estimou em 1,38 mil milhões de dólares as receitas para 2022 ligadas a este universo em franca expansão.
Em Portugal, começam a sentir-se os efeitos dessa aposta. Diogo Brás joga FIFA de forma competitiva desde os 14 anos. Aos 27, diz-se feliz por "conseguir fazer vida disto". "Temos contrato, ordenados e muitas competições. O circuito é muito mais profissional. As coisas evoluíram muito rápido nos últimos dois ou três anos, mas ainda há um longo caminho a percorrer", assinala.
Também José Carlos recebe um salário mensal "que já justifica as horas perdidas" na carreira de treinador de futebol virtual, iniciada há três anos, no Braga. Ainda assim, continua a conciliar essa paixão com o trabalho como chefe de secção numa serralharia.
Raul Faria sente que o eFootball já tem um "peso significativo" na FPF, que decidiu apostar na modalidade em 2017. De lá para cá fez-se "um percurso de sucesso", acredita o dirigente, com os atuais "30 mil jogadores e mais de 350 clubes registados" a suportarem a ideia.
"A tendência é a participação aumentar e criarem-se mais ligações com o mundo do futebol. Acreditamos que a projeção de, em 2024, atingirmos a marca dos 100 mil jogadores registados possa ser atingida", acrescenta o coordenador, que define a modalidade como "mista e sem barreiras de género ou idade", residindo aí grande parte do sucesso na sua implementação.
"O próprio Diogo Jota tem o seu clube de futebol virtual, e o campeão nacional individual pertence à equipa dele", acrescenta Raul Faria, que releva a aposta da FIFA no mundo do futebol virtual, a qual ajudou a uniformizar critérios e competições. "Desde 2020, a modalidade está a seguir um caminho mais uniforme. Também a Federação adaptou o seu ecossistema competitivo ao que a FIFA faz", refere.
A seleção nacional de futebol virtual, que em 2022 subiu ao primeiro lugar do ranking mundial, já conquistou um Campeonato da Europa, no ano passado, e foi terceira classificada no primeiro Mundial da história, em 2019. A nível individual, Diogo Pombo, ou "Tuga810" para os especialistas nesta matéria, foi considerado o melhor jogador do mundo de futebol virtual em 2022, na Globe Soccer Awards.
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Em março do ano passado, o Betclic Apogee conquistou a Supertaça, batendo o Boavista na final. K1CK e eFCPorto Soccersoul procuram-se suceder-lhe na lista de vencedores da prova, um objetivo partilhado por ambos os clubes.
"Todos os títulos são importantes", sublinha José Carlos, com Diogo Brás a confessar que "a Supertaça é um objetivo" para poder "entrar no ano com o pé direito". Neste caso, com o comando.