Pelo Mundo fora a ideia de que o futebol "não é para meninas" tem vindo a ser desmitificada, com o desporto a ganhar cada vez mais espaço na agenda dos espectadores. De Gaia surge um dos clubes pioneiros do futebol feminino em Portugal, com dez anos de existência e muita história para contar. O Valadares é o emblema com mais atletas inscritas na Federação Portuguesa de Futebol, com 134, e o segredo passa pelos valores incutidos e empatia com as futebolistas.
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O clube foi fundado em 2011 e um ano depois o presidente José Manuel Soares abriu portas ao futebol feminino. O começo de algo que não era usual em Portugal causou alguma confusão: não havia escalões e adolescentes treinavam com atletas já seniores, até que o Valadares, aos poucos, se foi consolidando.
Muitas jovens raparigas começaram a abordar o clube para jogarem futebol e a grande procura obrigou uma grande oferta. O Valadares criou mais escalões de formação e promoveu ações dinamizadoras junto das crianças para captar mais atletas para a casa. "Fomos às escolas de Valadares fazer atividades, entregámos panfletos, fizemos dias abertos, tudo para que mais meninas viessem jogar futebol. E fomos crescendo", conta Sara Pereira, coordenadora do futebol feminino do emblema de Gaia.
Em 2016 surgiu um dos melhores momentos do clube e aquele que o colocou num patamar maior. O Valadares conquistou a Taça de Portugal ao vencer o Benfica e provou que, mesmo sendo um clube pequeno, com ambição pode-se ir longe.
"Termos ganho a Taça de Portugal deu mais visibilidade e trouxe mais atletas ao clube. Fomos dos primeiros clubes a ter futebol feminino e por isso contribuímos para o crescimento do desporto em Portugal. O Valadares é conhecido a nível nacional no futebol feminino. Não temos a dimensão dos 'grandes' mas estamos aqui há mais tempo que eles, somos pioneiras", explicou Manuela Fonte, vice-presidente do futebol feminino.
O clube tem cinco escalões de formação e o investimento no desenvolvimento das camadas jovens ajuda a explicar o sucesso da equipa, visto que muitas atletas seniores são formadas no Valadares. Esta aposta motiva a que o clube seja recomendado por terceiros quando há o interesse de uma rapariga em jogar futebol.
Sara Pereira explica que "há professores em escolas ou treinadores de outros clubes que recomendam o Valadares", sobretudo quando é a fase de transição das atletas. Isto porque até aos 14 anos, as raparigas competem com os rapazes porque não há escalões de formação suficientes.
"O percurso aqui tem sido incrível. Conheci as minhas melhores amigas e pessoas que posso contar. É uma sensação muito boa estar aqui e descobrir uma nova família", explicou Marta Heleno, defesa central dos sub-17 do Valadares.
Mesmo com a entrada de Benfica e Sporting no futebol feminino, o Valadares continua a captar a atenção das jovens futebolistas. "As miúdas sentem que é mais fácil fazer a formação aqui e chegar a nível sénior do que num clube grande, porque futuramente podem não conseguir chegar a esse patamar", referiu Sara Pereira. "Passados dez anos, mesmo com a entrada dos 'grandes', nós continuamos num patamar alto e isso dá mais credibilidade ao nosso trabalho", acrescentou.
A pandemia da covid-19 colocou o Mundo do desporto em pausa e dificultou o processo de desenvolvimento de muitos jovens atletas. Sara Pereira explicou que o número de jogadoras diminuiu após o primeiro confinamento, em 2020, mas que o trabalho não parou. "Demos treinos online para não perder o contacto com elas, mas não conseguimos manter 100% das futebolistas. Com o passar do tempo fomos captando mais jogadoras e o número atual supera os valores pré-pandemia", disse.
O futebol feminino tem vindo a crescer em Portugal e Sara Pereira reconhece que o Valadares ganha muito com isso. "Há muitos clubes que criam equipas de futebol feminino e depois não lhes dão continuidade. Aqui, as miúdas sabem que o projeto do Valadares tem pés para andar", conta. Prova disso é o "segredo" para o sucesso do clube, segundo o relato de Marta Heleno. "Há uma empatia e ligação enorme entre todas as pessoas, sejam diretores ou treinadores, há uma grande amizade", revelou.
Um pequeno entre os grandes continua a lutar diariamente por algo que parece simples, embora seja complexo: proporcionar a prática desportiva a jovens raparigas e provar que o futebol também é das "meninas".